TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

384 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV – Carecendo a reposição do interesse público violado pela administração de ser concertada com outros interesses, públicos ou privados, cabe ao regime legal dos atos anuláveis – no âmbito do qual se admite a produção precária de efeitos pelo ato viciado e, decorrido o prazo (relativamente curto) para a sua impugnação, a respetiva consolidação na ordem jurídica –, a tarefa de viabilizar, no amplo conjunto de situações supletivamente configuráveis à luz do critério da gravidade prima facie adotado, a compa­ tibilização dos interesses colidentes que concorram no caso. V – A limitação do âmbito da nulidade à deliberação camarária que determina o lançamento de um tri­ buto ilegal, sem possibilidade da sua comunicação ao ato de liquidação respetivo – que é meramente anulável –, para além de constituir o resultado de uma opção que se inscreve na margem de discricio­ nariedade do poder legislativo, corresponde a uma forma de compatibilização do interesse particular do contribuinte afetado – que o poderá impugnar dentro do prazo para o efeito fixado − com o interesse público na estabilidade e na irreversibilidade das receitas cobradas, ambas essenciais à pos­ sibilidade de planeamento das múltiplas atividades desenvolvidas pelos municípios e daquela forma financiadas, sem o risco adveniente da eventual redução, a todo o momento, do valor para o efeito disponível. VI – Se o ato de liquidação do tributo fosse nulo – e não meramente anulável −, isso significaria que o vício seria insanável, pelo que as receitas a esse título já arrecadadas tornar-se-iam contingentes e precárias, o mesmo sucedendo com a possibilidade de concretização do amplo conjunto de atividades e prestações através delas financiadas; já reservando a nulidade para a deliberação dos órgãos dos municípios e/ou freguesias que determinem o lançamento de um tributo não previsto na lei – com o que se assegura a possibilidade de, a todo o momento, ser eliminada da ordem jurídica a fonte da obrigação tributá­ ria – e tornando os atos de liquidação meramente anuláveis – com o que se faculta ao contribuinte afetado a possibilidade de proceder à respetiva impugnação dentro do prazo resultante do artigo 123.º do Código de Processo Tributário ou, em caso de cobrança coerciva, até ao termo do prazo de oposi­ ção à execução fiscal –, o legislador torna possível a compatibilização dos interesses conflituantes que concorrem no caso, fazendo-o em termos, além do mais, inteiramente conformes ao critério geral que informa, de modo prevalecente, o ordenamento jurídico-administrativo. VII – Da confrontação da opção de tornar privativa das deliberações que aprovem tributos em violação da lei a consequência da nulidade, com a consequente recondução dos correspondentes atos de liquida­ ção ao regime geral da mera anulabilidade, com os limites impostos pelo princípio da igualdade, é manifesto que a mesma não é, nem injustificada, nem arbitrária; para além de conforme ao critério subjacente à categorização das invalidades administrativas acolhido pelo ordenamento jurídico, a dife­ renciação contida na norma impugnada traduz uma fórmula de conciliação dos interesses conflituan­ tes em caso de lançamento e subsequente liquidação de taxas camarárias sem previsão legal, fórmula essa que, por não ser destituída de fundamento, é insuscetível de qualquer censura à luz do princípio da igualdade. VIII– Quanto ao confronto da solução impugnada com os princípios constitucionais do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, em particular o direito de ação enquanto direito subjetivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional, tendo em consideração que o regulamento municipal ao abrigo do qual foi lançada e cobrada a taxa municipal em causa não foi declarado inconstitucional, mas apenas julgado inconstitucional num caso concreto, diverso do

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