TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

394 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de 6 de agosto, como ainda por efeito da sua qualificação como ato lesivo do “conteúdo essencial de um direito fundamental” nos termos prescritos na alínea d) do n.º 1 do artigo 133.º do CPA, considera o recor­ rido, nas contra-alegações que apresentou, que a convocação daquele primeiro conjunto de preceitos não integra a ratio decidendi do acórdão recorrido, o que obsta ao conhecimento do objeto do presente recurso de constitucionalidade. De acordo com a posição expressa pelo Município do Porto, “a conclusão de que o ato de liquidação da taxa de urbanização” prevista naquele diploma seria anulável e não nulo, foi equacionada de acordo com uma interpretação que (...) expressamente se focou (...) no artigo 133.º, n.º 2, alínea d), do CPA então em vigor”, pelo que, “a ser invocada uma pretensa questão de inconstitucionalidade, sempre deveria o recorrente ter-se centrado na interpretação conferida ao preceituado no artigo 133.º, n.º 2, alínea d), do CPA então em vigor, já que foi este o fundamento normativo da decisão recorrida para concluir pela mera anulabilidade do ato de liquidação”. Sem razão, porém. Conforme sabido é, os atos tributários constituem uma subespécie dos atos administrativos no sentido em que, tal como estes, são atos jurídicos unilaterais com caráter decisório, praticados no exercício de pode­ res jurídico-administrativos e destinados a produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta (sucintamente e a título ilustrativo, cfr., a propósito do conceito de ato administrativo, João Caupers/Vera Eiró, Introdução ao Estudo do Direito Administrativo , 11.ª edição, Lisboa, Âncora Editora, 2013, pp. 219- 225). A sua nota distintiva – isto é, o elemento que permite particularizá-los no conjunto dos atos adminis­ trativos – é dada pelo facto de serem atos emanados da administração tributária, que envolvem a imposição do pagamento de determinada quantia e se destinam a produzir efeitos da esfera jurídica dos contribuintes. Não contendo a legislação fiscal respetiva (nomeadamente, a Lei Geral Tributária e o Código de Proce­ dimento e de Processo Tributário) normas específicas quanto à invalidade dos atos tributários, estes encon­ tram-se sujeitos ao regime de invalidação em geral estabelecido para os atos administrativos: a anulabilidade é, assim, o desvalor jurídico regra (cfr. artigo 135.º do antigo CPA, considerado na decisão recorrida), só sendo nulos os atos a que falte qualquer dos elementos essenciais ou para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade −, como sucede com os atos previstos a título exemplificativo no n.º 2 artigo 133.º do antigo CPA, aplicado na decisão recorrida. Sem prejuízo do caráter não taxativo das causas de nulidade elencadas no n.º 2 do artigo 133.º do antigo CPA, convocado pelo tribunal recorrido, pode dizer-se que, na falta de previsão em sentido contrário, a invalidade da atuação da administração tributária se reconduzirá, em regra, à anulabilidade, cujo âmbito de aplicação se encontra, por isso, delimitado em termos subsidiários ou residuais no sentido em que é essa a consequência associável a todos os vícios para cuja violação não se encontre prevista a sanção da nulidade. Trata-se, assim, de uma consequência obtida sempre a contrario sensu, isto é, através do afastamento da possibilidade de subsumir o vício alegado a todas as normas que, de entre as configuráveis no caso, cominem a nulidade. Foi esse, justamente, o percurso efetuado pelo tribunal a quo. Foi, com efeito, da constatação de que o vício invocado pela ora recorrente não era subsumível nem à previsão das normas constantes dos artigos 1.º, n.º 4, da Lei n.º 1/87, de 6 de janeiro, e 2.º, n.º 4, da Lei n.º 42/98, de 6 de agosto, nem à fattispecie constante da alínea d) do n.º 1 do artigo 133.º do CPA, que o Tribunal Central Administrativo extraiu a conclusão de que o ato de liquidação impugnado não era nulo, não podendo, como tal, ser a todo o tempo posto em causa. A ratio decidendi do acórdão recorrido é integrada, assim, por este duplo afastamento, sendo certo que, perante o caráter subsidiário da mera anulabilidade, a reversão de apenas um deles – na verdade, de qualquer deles –, por constitucionalmente inviável, é suficiente para contender com a subsistência da solução jurídica alcançada no caso concreto, obrigando à reponderação do julgado.

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