TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

399 acórdão n.º 156/17 Conforme reiteradamente afirmado por este Tribunal, “[e]nquanto conceito relacional, a medida do que é igual e deva ser tratado como igual depende da matéria a tratar e do ponto de vista de quem estabelece a comparação, em termos de determinar quais são os elementos essenciais e os não essenciais num juízo acerca da admissibilidade ou inadmissibilidade de soluções jurídicas dissemelhantes e eventualmente mesmo discri­ minatórias”. Quer isto significar “que a prevalência da igualdade como valor supremo do ordenamento tem que ser caso a caso compaginada com a liberdade que assiste ao legislador de ponderar os diversos interesses em jogo e diferenciar o seu tratamento no caso de entender que tal se justifica” (cfr. Acórdão n.º 231/94). Acresce que, conforme igualmente salientado na jurisprudência constitucional, enquanto “critério de controlabilidade judicial”, o princípio da igualdade “não põe em causa a liberdade de conformação do legis­ lador ou a discricionariedade legislativa”: a “interpretação do princípio da igualdade como proibição do arbítrio” – que constitui um “critério essencialmente negativo” −, limita a possibilidade de censura aos “casos de flagrante e intolerável desigualdade”, sem que caiba ao juiz controlar “se o legislador, num caso con­ creto, encontrou a solução mais adequada ao fim, mais razoável ou mais justa” (cfr., entre outros, Acórdãos n. os  188/90, 455/02 e 531/06). Com fundamento em lesão do princípio da igualdade, só podem ser, por isso, invalidadas “as escolhas de regime feitas pelo legislador ordinário naqueles casos em que se prove que delas resultam diferenças de tratamento entre as pessoas que não encontrem justificação em fundamentos razoáveis, percetíveis ou inteli­ gíveis, tendo em conta os fins constitucionais que, com a medida da diferença, se prosseguem” (cfr. Acórdão n.º 47/10). Revertendo à situação sub judice à luz de quanto ficou dito, facilmente se percebe a falta de razão da recorrente. Desde logo, porque o tipo de diferenciação que invoca – a eventual discriminação resultante do facto lhe ter sido cobrada uma taxa urbanística consagrada num regulamento ulteriormente julgado inconstitucional, em sede de fiscalização concreta, com efeitos por isso limitados ao caso respetivo –– nada tem que ver com a distinção efetivamente produzida pela norma impugnada: com efeito, esta relaciona-se apenas com a opção de tornar privativa das deliberações que aprovem tributos em violação da lei a consequência da nulidade, com a consequente recondução dos correspondentes atos de liquidação ao regime geral da mera anulabilidade. Sendo esta diferenciação − e apenas esta − que caberá confrontar com os limites impostos pelo princípio da igualdade, é manifesto, em face do que acima ficou já exposto, que a mesma não é, nem injustificada, nem arbitrária. Sendo a nulidade insanável e o ato nulo passível de ser impugnado a todo o tempo, percebe-se, com efeito, que o legislador ordinário tenha reservado esse tipo de invalidade para as deliberações subjacentes ao lançamento de um tributo não previsto na lei – assegurando desse modo a possibilidade da sua invalidação a qualquer momento −, sem o estender aos atos de liquidação já praticados: por razões sobretudo atinentes à estabilidade financeira dos entes municipais, aos atos de liquidação foi assegurada a eficácia provisória e a permeabilidade ao decurso do tempo própria dos atos anuláveis, colocando-se ainda a possibilidade da sua impugnação na dependência do impulso do interessado. Conforme acima notado já, sobretudo com o pagamento voluntário – e o subsequente ingresso do valor do tributo nos cofres do município ou freguesia responsável pelo seu lançamento –, tem início o planea­ mento de um diverso conjunto de atividades destinadas à satisfação de necessidades públicas de âmbito local. Compreende-se, por isso, que, nos casos em que tal pagamento tenha já ocorrido, se sujeite a possibilidade da sua reversão ao prazo, relativamente curto, previsto para a invocação da anulabilidade, de modo a que, após o respetivo decurso, a entidade cobradora passe a poder contar, a título definitivo, com o valor da receita arrecada e, por não existir já o risco do seu reembolso, a planear a atividade que lhe cabe desenvolver em função dos meios pecuniários efetivamente disponíveis para o respetivo custeamento.

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