TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

448 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL b) ou, através da norma aplicada [como se entendeu ser o caso na decisão recorrida], se nega a existência de recurso na presente fase do processo, relegando para uma eventual fase posterior do mesmo a definitiva aferição da competência material do Tribunal de Instrução Criminal – cuja violação é rotulada pelo legisla­ dor infraconstitucional como nulidade insanável – o que redunda numa solução legal caótica, que endossa a (re)aferição do cumprimento das regras da competência do Tribunal de Instrução para uma putativa apreciação a realizar subsequentemente por um Tribunal hierarquicamente idêntico ao de Instrução (o de Julgamento), sendo que neste cenário, como o recurso relativo à questão do Juiz natural apenas subiria a final (vide artigo 407.º, n.º 1, a contrario sensu, do CPP), em caso de absolvição do Arguido após o julga­ mento em 1.ª instância, o mesmo deixaria de ter legitimidade para recorrer daquela decisão, solução legal que viola a tutela do princípio previsto no artigo 32.º, n.º 9, da CRP, violando os artigos 18.º, n.º 2, e 20.º, n.º 5, ambos da CRP. 65.º A norma aplicada viola ainda o direito do Arguido ao Recurso, consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da CRP. 66.º Efetivamente, à luz da Constituição o “recurso”, a que se refere o artigo 32.º, n.º 1, “ in fine ”, da CRP, não poderá deixar de ser um pedido de reapreciação, dirigido a um Tribunal hierarquicamente superior, relativamente a uma determinada questão apreciada por uma primeira instância judicial, sendo que, a competência e a hierarquia dos Tribunais, está expressamente prevista nos artigos 209.º a 211.º, todos da CRP, violando a decisão recorrido o conceito jurídico-constitucional de recurso, ao endossar a eventual reapreciação da questão ao um Tribunal da mesma hierarquia. 67.º Aliás, mesmo se a questão da competência vier a ser recolocada e (re)examinada pelo Tribunal de Julgamento, o recurso de tal eventual decisão, liminar, interlocutória ou incluída na Sentença, apenas será mandado subir a final, sob o provável argumento de que a sua retenção não o toma absolutamente inútil (vide artigo 407.º, n.º 1, a contrario sensu , do CPP). 68.º Pelo que, nesse caso, havendo condenação do Arguido, mesmo que se viesse a reapreciar a questão, e a confir­ mar em recurso a incompetência do T.I.C, o Arguido terá sido pronunciado e será submetido a julgamento por decisão de um órgão incompetente, com base numa decisão não definitiva, por compressão do direito ao juiz legal, e, por acréscimo, do “direito a não ser submetido a julgamento”, cuja existência se sabe “não é pacífica na jurispru­ dência do TC”, quando o Arguido a julgar se presume inocente (artigo 32.º, n. º 2, da CRP). 69.º E que, uma coisa é submeter o Arguido a julgamento face ao trânsito em julgado de uma decisão relativa aos indícios da prática do crime, à luz de um juízo indiciário insindicável por qualquer outro Tribunal e tendencial­ mente irreversível, outra, bem diferente, será submeter-se o Arguido a julgamento com base num juízo indiciário quando a validade do mesmo depende da competência do Tribunal de Instrução que o proferiu, questão esta que fica em aberto, e para (re)apreciar pelo Tribunal de Julgamento. 70.º Neste caso, o que a norma permite é que se avance para o julgamento do Arguido sem que exista um mínimo de certeza jurídica quanto à subsistência/manutenção da própria decisão instrutória, e que se submeta o Arguido a julgamento nessas circunstâncias, afigurando-se materialmente inconstitucional tal compressão do direito à

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