TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

458 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Por conseguinte, acrescenta a Autora que a sua pensão deveria ser calculada com base na fórmula prevista no artigo 5.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, mas na redação anterior à introduzida pela Lei n.º 11/2014, de 6 de março, por ser esta a que se encontrava em vigor à data da apresentação do pedido de aposentação. Cumpre relembrar que quando o interessado, por considerar que reúne os pressupostos para a aposentação, declara que se quer aposentar, exerce um direito – o direito à aposentação. E, se o Subscritor exerce esse direito – em determinado momento – com base no preenchimento de todos os requisitos de que a lei o faz depender, fá-lo à luz de um determinado regime legal, cujo reconhecimento do direito e cálculo da pensão dependerá da combinação de fatores tais como idade, tempo de serviço e remuneração mensal relevante. Extrai-se da factualidade que o pedido de aposentação demorou meses a ser decidido e a mutação na ordem jurídica ocorreu na pendência do procedimento, pouco antes da tomada de decisão pela Administração. Por sua vez, a mutação na ordem jurídica não foi motivada por necessidade de salvaguardar direitos ou interes­ ses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes à da Autora, mas tão-só a concretização de uma vontade de convergência do regime de proteção social da função pública com o regime da segurança social. Com efeito, o Tribunal depara-se com um caso que merece ser entendido como violador do princípio da con­ fiança, por considerar que a aplicação da lei em vigor na data em que se proferiu o despacho a reconhecer o direito à aposentação afetou, de forma inadmissível e demasiadamente onerosa, as expectativas legitimamente fundadas da Subscritora, ora Autora, na data em que apresentou o requerimento. Cumpre destacar que o ato em crise tem conteúdo estritamente vinculado do direito do interessado à aposen­ tação. Por isso, o regime jurídico aplicável tem que ser considerado como fator determinante para a manifestação da vontade dos subscritores quando apresentam o requerimento para a aposentação. Fazer depender o quantum da pensão de um facto totalmente alheio à manifestação de vontade dos particulares lesa de forma excessiva, inadmissível ou intolerável, as expectativas legítimas que estes depositam na ordem jurídica. Este é, no nosso entender, a razão central para, com fundamento em inconstitucionalidade material, se desapli­ car a norma contida no artigo 43.º, n.º 1, do Estatuto da Aposentação, na redação dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro. Sendo de acrescentar que a sua aplicação pode conduzir ao tratamento desigual de situações idênticas. Pode entre a apresentação do requerimento e a decisão final ocorrer um intervalo de tempo mais ou menos prolongado, em que a aplicação do regime jurídico fica dependente, designadamente do acaso ou da vontade da Administração ou dos meios humanos colocados ao seu dispor, sem qualquer critério com que o subscritor possa contar, pondo em crise, desde logo, a imagem de uma Administração isenta e imparcial, além de violar o princípio da igualdade enquanto manifestação do princípio do Estado de direito. Entendemos, assim, que deverá relevar a data em que é apresentado o requerimento, quando o interessado já reunir os pressupostos para a concessão da aposentação, uma vez que no momento em que faz o pedido já o direito à aposentação se encontra adquirido. Porquanto, face à natureza estritamente vinculada do ato, o interessado, quando requer a aposentação, tem uma legítima expectativa de que a pensão lhe vai ser concedida nos moldes legais existentes e por si conhecidos. Importa relembrar que a convocação de critérios de razoabilidade e de proporcionalidade para averiguar de eventuais violações do princípio da confiança já foi efetuada pelos nossos Tribunais Superiores e pelo próprio Tri­ bunal Constitucional, sem nunca pôr em causa a ampla liberdade de conformação reconhecida ao legislador num contexto de proteção social. É certo que os trabalhadores não beneficiam, no quadro da Constituição, de um qualquer direito à «imuta­ bilidade do sistema» de proteção social, mas também é certo que a conformação reconhecida ao legislador não autoriza a frustração de expectativas legítimas. Por outras palavras, a conformação reconhecida ao legislador não vai ao ponto de permitir alterar os pressupostos da situação dos subscritores na pendência do processo de aposentação, desde que estes reúnam – à data do pedido – os pressupostos de que a lei faz depender a aposentação. Assim, por se considerar que a aplicação – no caso concreto – do artigo 43.º do Estatuto da Aposentação, na redação dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, viola os princípios do Estado de direito democrático (artigo 2.º da CRP) e da igualdade (artigo 13.º da CRP), determina-se a sua desaplicação, devendo ser praticado novo ato

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