TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

467 acórdão n.º 195/17 b) quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente prote­ gidos que devam considerar-se prevalecentes (deve recorrer-se, aqui, ao princípio da proporcionalidade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição). Os dois critérios enunciados (e que são igualmente expressos noutra jurisprudência do Tribunal) são, no fundo, reconduzíveis a quatro diferentes requisitos ou “testes”. Para que para haja lugar à tutela jurídico-constitucional da «confiança» é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comporta­ mentos capazes de gerar nos privados «expectativas» de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do «comportamento» estadual; por último, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa.» Ora, face ao teor do artigo 43.º, n.º 1, do EA, não se vê como os funcionários que requerem a apo­ sentação – como é o caso da recorrida – possam alimentar qualquer expectativa razoável na estabilidade do regime vigente nesse momento. Determinando esse preceito que o regime é fixado segundo a lei vigente no momento em que é proferido o despacho de admissão – o que consubstancia simultaneamente uma «previ­ são genérica da possibilidade de mudança de regimes» (Acórdão n.º 302/06) e uma opção clara no sentido de que o momento do requerimento não determina a lei aplicável – o requerente não tem qualquer razão para crer na estabilidade do quadro legal contemporâneo da decisão de se aposentar. Como se afirmou no Acórdão n.º 580/99, em termos integralmente aplicáveis ao caso sub judice , «a recorrente sabia, quando requereu a pensão, que o respetivo montante seria fixado de acordo com a lei vigente no momento da prolação desse despacho» e «[u]ma vez que era já configurável a possibilidade de a sua situação vir a ser definida de acordo com o regime introduzido por uma eventual alteração legislativa, a recorrente não tinha uma expectativa consolidada de ver a sua pensão fixada de acordo com a lei vigente no momento em que apresentou o respe­ tivo requerimento.» No mesmo sentido milita o seguinte trecho do Acórdão n.º 302/06: «Não parece, assim, desde logo, que se possa dizer que a alteração em causa afetou expectativas legítimas dos destinatários da norma, sendo seguro que, ainda que assim não fosse, não se poderia dizer que a alteração legislativa em causa constituísse uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas não pudessem contar – justamente, por, como o legislador esclareceu já no artigo 43.º do Estatuto da Aposentação, deverem contar com mutações do regime da aposentação (em sentido favorável ou desfavorável, embora, evidente­ mente, sem poderem adivinhar o sentido preciso dessas mutações) até à data em que se verifiquem os pressupostos que dão origem à aposentação.» Não estando preenchido o primeiro pressuposto ou requisito da tutela da confiança – uma mutação da ordem jurídica com a qual os destinatários não possam razoavelmente contar ou um comportamento do Estado suscetível de gerar nos particulares expectativas de continuidade – nenhuma censura constitucional pode, com fundamento em tal princípio, ser dirigida à norma sindicada. 12. Sucede que o princípio da proteção da confiança é apenas uma das vertentes ou refrações da segu­ rança jurídica, valor matricial do Estado de direito democrático. O seu alcance, como vimos, é essencial­ mente retrospetivo: o poder público não pode, exceto na exata medida em que para tal tenha razões justas ou imperiosas, defraudar as expectativas que o seu comportamento gerou nos cidadãos e depredar os inves­ timentos que estes realizaram nesse pressuposto.

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