TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

469 acórdão n.º 195/17 fundamentação do Acórdão n.º 615/07, a propósito da norma que fixava o regime da aposentação segundo a lei vigente no momento do envio do processo à CGA. Trata-se aqui, evidentemente, do princípio geral da igualdade, consagrado no artigo 13.º, n.º 1, da Constituição, e não da sua refração explicitada no n.º 2 do mesmo artigo, a qual consubstancia a proibição de discriminação de minorias ou grupos sociais definidos com base em «classificações suspeitas». Sobre o alcance do princípio geral da igualdade enquanto norma de controlo judicial do poder legisla­ tivo, escreveu-se no Acórdão n.º 409/99: «O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, impõe que se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente dife­ rente. Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objetivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adoção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fun­ damentação razoável, objetiva e racional. O princípio da igualdade enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio.» A questão que se coloca, pois, é a de saber se a norma sindicada, ao permitir que sejam tratados de modo diferente – ou seja, sujeitos a regimes diversos de cálculo da pensão de aposentação – requerentes contempo­ râneos, estabelece entre eles uma distinção arbitrária, porque destituída de qualquer fundamento racional. Para responder a tal questão, é indispensável que se determine qual o ponto de vista ou termo de comparação entre os sujeitos a tratamento diferenciado pela norma sindicada. Segundo o Acórdão n.º 580/99, o tertium comparationis é o momento do reconhecimento do direito à aposentação, pelo que nada há a censurar no tratamento diferenciado de requerentes contemporâneos cujo processo foi despachado no domínio da vigência de leis diferentes. «O argumento segundo o qual a igualdade seria violada pela possibilidade de requerentes contemporâneos, em situações idênticas, obterem despacho de reconhecimento do direito à pensão em datas diferentes […] não procede, porque a referida data do requerimento não constitui o momento pelo qual seja aferível a igualdade de posições perante a lei dos titulares do direito. O momento do reconhecimento do direito, esse sim, é o ponto de referência pelo qual a igualdade deve ser plenamente aferida.» Todavia, dizer que o momento de reconhecimento do direito é o termo de comparação relevante equivale a dizer que, para determinar se a diferenciação legal é arbitrária, releva o próprio critério legal de diferenciação. A seguir semelhante entendimento, a proibição do arbítrio não teria qualquer conteúdo útil enquanto norma de controlo; e, na verdade, tal ponto de vista reflete uma confusão entre o critério legal de diferenciação, com base no qual se delimita a classe dos destinatários da lei, e o fundamento racional para tal critério, o qual se encontra na ratio ou finalidade por aquela servida. Uma distinção legal é racional se for ditada pela própria finalidade da lei; atente-se na distinção entre automóveis ligeiros e pesados no regime que estabelece os limites de velocidade na circulação rodoviária. E será arbitrária se não tiver qualquer relação, ou uma relação comensurável, com a ratio legis, como seria o caso se a lei estabelecesse limites de velocidade diversos consoante a proveniência geográfica do construtor do automóvel. Chega-se a estas conclusões, como é bom de ver, através da determinação, ainda que implícita, de um termo de comparação entre as pessoas ou situações diferenciadas pela lei; no caso dos limites de velocidade, cuja finalidade é mitigar o risco de aciden­ tes e dos danos emergentes da sua ocorrência, o tertium comparationis são as propriedades dos veículos que os tornam mais ou menos perigosos e mais ou menos aptos a provocar danos em caso de acidente ─ contando-se entre tais propriedades a massa do veículo, mas não a origem do seu construtor. Ora, na fixação do regime aplicável à aposentação voluntária, releva seguramente o momento em que o direito à aposentação é exercido. Nenhuma arbitrariedade há no facto de dois funcionários, com carreiras

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=