TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

475 acórdão n.º 208/17 Face ao que ficou dito, conclui-se neste capítulo que aos juízes de paz são inaplicáveis as normas aplicadas pelos atos impugnados ou outras, relativas à função pública, em particular aos cargos dirigentes, das quais resulte uma solução diversa da que se verifica para os magistrados judiciais. Só com base em inaptidão pode cessar em cada período de um ano a comissão de serviço e findos esses três anos se não houver decisão de declarar o juiz inapto para o exercício de funções, a nomeação torna-se definitiva. Esta é a única interpretação possível das normas aplicáveis, por aplicação direta, extensiva ou analógica, aos juízes de paz, acima referidas, como único estatuto compatível com a independência necessária ao exercício das funções de juiz, constitucionalmente consagrado. Termos em que, considerando aplicável aos juízes de paz o esta­ tuto da função pública, com a possibilidade de cessação automática da comissão findos os 3 anos de serviço, as deliberações impugnadas violaram efetivamente as normas que devem ser aplicadas aos juízes de paz, as normas reguladoras do estatuto dos magistrados judiciais, em fase de formação, única solução uniformizadora do trata­ mento estatutário de todos os juízes, categoria na qual se inserem os juízes de paz. Assim como seria desconforme à Constituição, e uma clara funcionalização destes juízes, como prejuízo para a sua independência, a possibilidade, defendida aqui pelo Réu, de sucessivas renomeações por 3 anos, aplicando ao caso o regime dos cargos dirigentes da função pública». 2. Desse acórdão do TCAN interpôs o Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante LTC), sustentando ter sido recusada a aplicação, com fundamento na sua inconstitucionalidade, das normas cons­ tantes dos artigos 25.º, n.º 1, e 29.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, dos artigos 5.º e 7.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 427/89 e dos artigos 21.º, n.º 8, 24.º, n.º 1 e 25.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, na redação dada pela Lei n.º 78/2001, de 13 de julho (cfr. fls. 682 e seguintes). Notificada do requerimento, a autora, então recorrida, sustentou nos autos a inadmissibilidade do recurso, uma vez que o TCAN se limitara «a recorrer ao princípio da interpretação conforme como princípio orientador da interpretação normativa», movendo-se «sempre no domínio interpretativo, não tendo procedido à desapli­ cação de quaisquer normas com fundamento na sua inconstitucionalidade” (cfr. fls. 728 e seguintes). Nessa sequência, o TCAN rejeitou o recurso, com fundamento em que não foram desaplicados “os artigos 25.º e 29.º da Lei 78/2001, nem a legislação reguladora da função pública” e que “apenas se fez uma interpretação das normas e das respetivas lacunas, designadamente no que respeita à possibilidade de cessação automática da comissão de serviço dos juízes de paz, de acordo com os princípios constitucionais, em particular da inde­ pendência e inamovibilidade dos juízes” (cfr. fls. 834), decisão confirmada pelo Acórdão n.º 755/13, deste Tribunal, proferido em 23 de outubro de 2013 (acessível em www.tribunalconstitucional.pt , como todos os adiante referidos), indeferindo reclamação apresentada pelo então recorrente. Concluiu o Tribunal que “a solução encontrada pelo tribunal a quo  se fundamentou numa preocupação de harmonização do estatuto dos juízes de paz com o dos demais juízes, e que nessa tarefa de harmonização se deveria buscar a solução mais compatível com a Constituição”; “Ora, neste contexto, poderá falar-se quando muito de uma interpretação, – ou até de uma integração de lacunas – em conformidade com a Constituição, mas não de uma recusa de normas por inconstitucionalidade.” 3. Na pendência do recurso atrás aludido, o Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz inter­ pôs recurso de revista, ao abrigo do artigo 150.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (cfr. fls. 762 e seguintes), tendo a aqui recorrente apresentado contra-alegações em 27 de março de 2014 (após o Acórdão n.º 755/13; cfr. fls. 851 e seguintes). A revista foi concedida e a ação julgada improcedente, por acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA) em 30 de junho de 2016, o qual, afas­ tando a interpretação adotada pelo TCAN, entendeu:

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=