TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

480 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL II – Fundamentação 8. Confrontada com a decisão sumária proferida, que conclui pelo incumprimento do ónus de susci­ tação prévia das normas postas a controlo por este Tribunal, conforme imposto pelo n.º 2 do artigo 72.º em caso de mobilização da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, ambos da LTC, e, consequentemente, pela sua ilegitimidade para o recurso interposto, dela vem a recorrente reclamar. Para tanto, articula essencialmente dois argumentos, qualquer deles idóneos a assegurar a pretendida reversão do sumariamente decidido: (i) que deu efetivo cumprimento ao ónus referido, pois “as questões de inconstitucionalidade foram expressa e ade­ quadamente invocadas (...) nas contra-alegações apresentadas perante o Supremo Tribunal Administrativo”; e (ii) que, in casu , não lhe é exigível tal obrigação, pois, “tendo defendido uma determinada interpretação conforme à Constituição ao longo de todo o processo e tendo obtido provimento nas primeira e segunda instâncias, não é razoável exigir-lhe que, em sede de contra-alegações, e estando o objeto do recurso delimi­ tado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, repita integralmente toda a argumentação que aduziu ao longo do processo no sentido de justificar a inconstitucionalidade das disposições legais ou de certa interpre­ tação das mesmas”. 9. Preliminarmente, é necessário recordar que a exigência de suscitação prévia da questão de inconsti­ tucionalidade normativa não constitui mera questão secundária, antes exigência formal de caráter essencial, cujo fundamento radica na natureza da intervenção fiscalizadora do Tribunal Constitucional, por via de recurso, em regra votado a reapreciar questão que o tribunal a quo estava vinculado a conhecer, e não a diri­ mir questões novas, em concretização, sublinhe-se, de injunção constitucional [artigo 280.º, n.º 1, alínea b) , da Lei Fundamental]. Na expressão do Acórdão n.º 590/94: «[7.] O recurso da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional pressupõe que o recor­ rente tenha suscitado, durante o processo, a inconstitucionalidade de uma norma jurídica (ou de um seu segmento ou de certa interpretação dela) e que, não obstante a acusação de ilegitimidade constitucional que lhe foi feita, a decisão recorrida a tenha aplicado no julgamento do caso. […] De facto, a inconstitucionalidade de uma norma jurídica só se suscita durante o processo, quando tal questão se coloca perante o tribunal recorrido a tempo de ele a poder decidir e em termos de ficar a saber que tem essa questão para resolver – o que, obviamente, exige que quem tem o ónus da suscitação da questão de constitucionalidade a coloque de forma clara e percetível. Bem se compreende que assim seja, pois que, se o tribunal recorrido não for confrontado com a questão de constitucionalidade, não tem o dever de a decidir. E, não a decidindo, o Tribunal Constitucional, se interviesse em via de recurso, em vez de ir reapreciar uma questão que o tribunal recorrido julgara, iria conhecer dela ex novo . A exigência de um cabal cumprimento do ónus da suscitação atempada – e processualmente adequada – da questão de constitucionalidade não é, pois – […] –, uma “mera questão de forma secundária”. É uma exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal recorrido deva pronunciar-se sobre a questão de constitucionalidade e para que o Tribunal Constitucional, ao julgá-la em via de recurso, proceda ao reexame (e não a um primeiro julgamento) de tal questão.» Assim, conforme jurisprudência constante e uniforme, a suscitação prévia de uma questão de inconstitu­ cionalidade implica que o recorrente tenha cumprido o ónus de a colocar ao tribunal recorrido, enunciando-a de forma expressa, clara e percetível, de modo a vincular o tribunal a quo a um dever de pronúncia sobre a matéria a que tal questão normativa se reporta. Acresce que, no caso de se pretender questionar apenas uma certa interpretação normativa, extraída de uma disposição legal ou da conjugação de vários preceitos,

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