TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

481 acórdão n.º 208/17 é indispensável que o recorrente especifique claramente qual o sentido ou dimensão normativa do preceito ou preceitos que tem por violador da Constituição, enunciando cabalmente e com precisão e rigor todos os respetivos elementos essenciais. Ora, como se refere na decisão reclamada, a recorrente não deu cabal cumprimento a tais exigências. 10. Com efeito, a recorrente destaca na reclamação – ainda que o faça a título de “mero exemplo” – o que escreveu nos artigos 57.º, 70.º, 72.º e 73.º e nas conclusões U), X), Y), Z), AA), BB), CC) e DD) das contra-alegações apresentadas no âmbito do recurso de revista. Note-se que, em defesa do respeito pelo apontado ónus, no requerimento de interposição de recurso é feita menção tão somente aos artigos 57.º e 73.º da mesma peça processual. 10.1. O artigo 57.º inscreve-se no segmento das contra-alegações intitulado “Do regime aplicável aos juízes de paz e da alegada desaplicação com fundamento na sua inconstitucionalidade, no qual é tomada posição sobre diversas questões de inconstitucionalidade suscitadas pelo Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz perante o STA. Em linha com o que sustentara a fls. 728 e seguintes – e vira acolhido por este Tribunal, no Acórdão n.º 755/13 –, defendeu aí a ora recorrente que não havia sido desaplicada qualquer norma com fundamento em inconstitucionalidade, antes efetuado adequado esforço exegético sobre o regime contido nos artigos 21.º e 29.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, que conduziu a resultado interpretativo diferente do sufragado por aquele Conselho. Nesse contexto, afirma-se: “Acresce que, e con­ trariamente ao que pretende fazer crer o recorrente, efetivamente, o que o acórdão do Tribunal a quo realizou é uma interpretação conforme à Constituição”. 10.2. Porém, com tal afirmação, a recorrente mais não faz do que tomar posição quanto à melhor interpretação do direito infraconstitucional, por respeitar na sua plenitude os cânones constitucionais con­ vocáveis, à luz do princípio da interpretação conforme à Constituição, movendo-se no plano da discussão do acerto hermenêutico da decisão – matéria que não incumbe a este Tribunal sindicar –, e não, a jusante do labor interpretativo, no plano da conformidade constitucional da norma assim revelada ao intérprete. Na verdade, o princípio da interpretação conforme à Constituição inscreve-se nos princípios gerais da inter­ pretação, constituindo, como refere Gomes Canotilho, “instrumento hermenêutico de conhecimento das normas constitucionais que impõe o recurso a estas para determinar e apreciar o conteúdo intrínseco da lei” ( Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 7.ª edição, p. 1310); donde, a simples invocação da sua justificação ou necessidade, ou a mera rejeição genérica de qualquer outro resultado interpretativo, não equivalem funcionalmente, no quadro da fiscalização concreta cometida ao Tribunal Constitucional, à enunciação clara e precisa de um sentido normativo comportado no texto do preceito ou preceitos em equação e que – prevenindo o acolhimento e efetiva aplicação de outro dos sentidos possíveis da lei – deva ser recusado pelo julgador, por constitucionalmente insolvente. 10.3. Os demais artigos do corpo das contra-alegações mencionados pela recorrente – 70.º, 72.º e 73.º – prosseguem a mesma linha argumentativa, centrada na aferição da correção hermenêutica do decidido pelo TCAN, oferecendo apoio doutrinário e jurisprudencial relativamente “à existência de uma lacuna da lei que o tribunal a quo supriu com recurso ao Estatuto dos Magistrados Judiciais”, em suporte da interpretação analógica a que recorrera aquela instância de recurso. No artigo 70.º, encontra-se citação atribuída a Jorge Miranda, em trecho onde se refere que “Da aplicabilidade das referidas garantias constitucionais aos juízes de paz resulta a inconstitucionalidade do artigo 29.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, quando interpretada no sentido de tornar aplicáveis aos juízes de paz direitos e deveres do regime de função pública incompatí­ veis com aquelas garantias constitucionais”. Segue-se menção a jurisprudência do Tribunal Constitucional,

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