TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

483 acórdão n.º 208/17 11. Assente que a recorrente não suscitou perante o STA as questões de inconstitucionalidade que ins­ creve no requerimento de interposição de recurso, cabe averiguar se, como pretendido na reclamação, esta­ remos perante uma das situações excecionais que justificam o reconhecimento da inexigibilidade de outro comportamento da parte. A recorrente não invoca, quer a imprevisibilidade objetiva do critério normativo aplicado como determinante do julgado, quer a ausência de oportunidade processual para a suscitação de questão de inconstitucionalidade normativa perante o tribunal a quo – eventualidades que têm sido amiúde acolhidas pelo Tribunal como razão suficiente para o não cumprimento do ónus –, em coerência, aliás, com a alegação atrás apreciada, de que havia confrontado, tempestiva e adequadamente, o tribunal a quo com o problema de inconstitucionalidade que pretende ver apreciado por este Tribunal. Pretende, no entanto, que, tendo obtido ganho de causa nas instâncias, não é “razoável” que, enquanto recorrido, lhe seja imposta a repetição do que já invocara nas fases precedentes do processo em sede de questionamento de inconstitu­ cionalidade. 11.1. Esse argumento remete para a discussão, mantida na vigência da versão originária da LTC, sobre se, para aferir do cumprimento do ónus de suscitação prévia, deve atender-se às posições assumidas pela parte em qualquer momento do processo ou, ao invés, apenas as peças processuais dirigidas ao tribunal que pro­ fere a decisão recorrida, e por este cognoscíveis até ao esgotamento do respetivo poder jurisdicional, relevam funcionalmente para satisfazer a exigência de suscitação, mesmo que o recorrente obtivesse ganho de causa na instância inferior e, consequentemente, fosse recorrido na impugnação julgada pela decisão recorrido. A esse problema foi dada resposta divergente pelas seções do Tribunal, até que, em 1998, o legislador modificou a redação do artigo 72.º, n.º 2, da LTC, plasmando no preceito, através da locução “de forma processualmente adequada perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida”, a solução normativa sufragada pela segunda orientação jurisprudencial enunciada. Disso mesmo dá notícia o Acórdão n.º 376/07 (também aludido na decisão sumária reclamada): «Sabido que, na vigência da versão originária da LTC, se registou divergência na jurisprudência do Tribunal Constitucional quanto a saber se, para assegurar a abertura da via do recurso previsto na alínea b) , do n.º 1, do artigo 70.º, bastava que a questão de constitucionalidade houvesse sido suscitada em qualquer fase processual, ou se era necessário que essa suscitação ocorresse perante a instância que proferiu a decisão de que se recorre para o Tribunal Constitucional, mesmo que o recorrente tivesse obtido ganho de causa na instância inferior e, portanto, figurasse como recorrido no recurso onde foi proferida esta decisão. A primeira posição foi perfilhada pela então 1.ª Secção (cfr. Acórdãos n. os 232/92, publicado em “ Acórdãos do Tribunal Constitucional ”, vol. 22.º, p. 581, 280/92, publicado em “ Acórdãos do Tribunal Constitucional ”, vol. 22.º, p. 895) e a segunda pela então 2.ª Secção (cfr. Acórdãos n. os 468/91, publicado em “ Acórdãos do Tribunal Constitucional” , vol. 20.º, p. 557, 469/91, publicado em “ Acórdãos do Tribunal Constitucional ”, vol. 20.º, p. 567, e 182/95, publicado em “ Acórdãos do Tribunal Cons- titucional ”, vol. 30.º, p. 905). A disputa foi legislativamente decidida no sentido da segunda posição, com a alteração do n.º 2, do artigo 72.º, da LTC, operada pela Lei n.º 13A/98, de 26 de fevereiro, que passou a exigir – em sede de legitimidade para recorrer, nos recursos previstos nas alíneas b) e f ) , do n.º 1, do artigo 70.º – que a “parte (…) haja suscitado a questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer”. Como reconhecem Guilherme da Fonseca e Inês Domingos (em Breviário de Direito Processual Constitucional (Recurso de Constitucionalidade), 2.ª edição, Coimbra, 2002, pp. 5859): “Hoje, porém, face à nova redação dada ao referido preceito legal, que exige dever a questão ser suscitada adequadamente, ou seja, de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, consagrouse o entendimento seguido pela então 2.ª Secção. Exige-se, pois, que o interessado nunca deixe “cair” ou “abandonar” a questão de inconstitucionalidade nas várias instâncias de recurso”.

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