TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

501 acórdão n.º 105/17 Dado o teor do requerimento de interposição de recurso, a decisão recorrida é o acórdão arbitral do tribunal arbitral constituído junto do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, de 5 de julho de 2016. No requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, o ora reclamante solicitou a apreciação da constitucionalidade das seguintes normas: «norma ínsita na Base XCVIII, n.º 3, das Bases da Concessão do Troço Poceirão-Caia da Rede Ferroviária de Alta Velocidade, aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 33-A/2010, de 4 de abril» e «interpretação que o tribunal arbitral operou, no caso concreto, do artigo 619.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (doravante “CPC”) e do primeiro segmento do artigo 621.º da mesma codificação legal, quando interpretados no sentido de que inexiste vinculatividade para um tribunal arbitral de um decisório – nele se incluindo os respetivos fundamentos – proferido pelo Tribunal de Contas, em matéria em que este último é exclusivamente competente, nos termos da Constituição e da lei, para proferir tal decisão». Como se viu, o tribunal arbitral não admitiu o recurso de constitucionalidade quanto à primeira das normas sindicadas. No que à segunda norma diz respeito, o tribunal arbitral admitiu restritivamente o recurso, enunciando no dispositivo do despacho ora reclamado o conteúdo da norma que considerava poder ser sindicada perante o Tribunal Constitucional. Foi contra esta decisão que foi apresentada a presente reclamação. Porém, nela o reclamante circunscre­ veu expressamente o seu objeto à primeira das normas enunciadas, contida na Base XCVIII, n.º 3, das Bases da Concessão do Troço Poceirão-Caia da Rede Ferroviária de Alta Velocidade, que foram aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 33-A/2010, de 14 de abril. Desta forma – e independentemente do juízo que se possa vir a fazer oportunamente sobre a extensão dos poderes do tribunal arbitral na delimitação das normas que constituem objeto do recurso de constitucio­ nalidade – a presente reclamação cinge-se ao segmento do despacho que não admitiu o recurso de constitu­ cionalidade quanto à norma da Base XCVIII. 7. Para não admitir o recurso de constitucionalidade quanto à norma em questão, o tribunal a quo começou por argumentar que o próprio reclamante considerou que a Base XCVIII, n.º 3, das Bases da Con­ cessão do Troço Poceirão-Caia da Rede Ferroviária de Alta Velocidade, aprovadas e publicadas pelo Decreto-Lei n.º 33-A/2010, de 14 de abril (doravante referidas através da expressão abreviada «Bases da Concessão») era destituída de natureza normativa, razão pela qual, de acordo com a hierarquia entre fontes, não poderia contrariar o disposto no artigo 45.º, n.º 3, da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, aprovada pela Lei n.º 98/97, de 26 de agosto (adiante designada pela sigla «LOPTC»). Contrapôs o reclamante que, de acordo com o conceito funcional de norma pacificamente aceite na jurisprudência constitucional, não obstante as referidas Bases da Concessão terem uma natureza material­ mente administrativa, nem por isso deixam de revestir a forma de lei e de consubstanciar uma «regra de conduta» ou um «critério de decisão» para os particulares, para a Administração e para os tribunais. Importa notar que tal argumento de não admissão do recurso desempenha um papel secundário na fundamentação da decisão recorrida. Esta limita-se a referir a posição expressa pelo reclamante, sem que o tribunal a quo assuma, ao menos de forma clara, que considera a Base XCVIII objeto inidóneo de um recurso de constitucionalidade. Em qualquer caso, o certo é que nessa matéria assiste razão ao reclamante. Como se referiu no recente Acórdão n.º 695/16 deste Tribunal, «a equação entre norma-objeto de con­ trolo de constitucionalidade e norma-regra geral e abstrata é incompatível com a ideia, há muito assente na jurisprudência constitucional, de que “para o efeito do disposto nos artigos 277.º e seguintes da Constituição [deve procurar-se] um conceito funcional de “norma”, ou seja, funcionalmente adequado ao sistema de fis­ calização da constitucionalidade aí instituído.” De tal forma que “na averiguação e determinação do que seja “norma”, para esse efeito, não pode partir-se de uma noção material, doutrinária e aprioristicamente fixada, desse conceito. E, designadamente, não pode partir-se da ideia clássica que liga ao mesmo conceito notas

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