TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

523 acórdão n.º 161/17 n.º 3 deste artigo, o seguinte: “3. As leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstrato e não podem ter efeito retractivo, nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais”.)] e que o recurso de constitucionalidade é, igualmente, um direito constitucionalmente consa­ grado [artigo 280.º, n.º 1, al. b) , da CRP]. Efetivamente, salvo o devido respeito, a decisão ora reclamada, além de não ter em conta que não está em causa um recurso de constitucionalidade que incida sobre uma decisão prolatada após a apreciação de um recurso ordinário anterior (cujo regime a “ ratio legis ” do artigo 78.º, n.º 3, da LTC, entendeu manter), adotou uma solução normativa que provoca a inutilidade da decisão a proferir no âmbito do recurso de constitucionalidade interposto pelo Reclamante, na parte em que visa sindicar a constitucionalidade dos “artigos 406.º, 407. º e 408. º do CPP, interpretados no sentido de o recurso penal interposto pelo Arguido em que esteja em causa a litispendência tem subida diferida, nos próprios autos, juntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa e, consequentemente, efeito meramente devolutivo, por violação dos artigos 18. º, n.º 2, 32.º, n. os 1 e 2 e 29.º; n.º 5, todos da CRP e da vertente processual do princípio “ ne bis in idem ” É evidente que, no caso concreto e quanto a este segmento recursório, não se poderá deixar de ter presente que o que o recorrente, ora Reclamante, pretende é que o Tribunal Constitucional afira da constitucionalidade da interpretação normativa que determina a subida a final do recurso ordinário por si interposto, inicialmente admitido pelo Tribunal recorrido com subida imediata e efeito suspensivo, com fundamento na imperatividade de salvaguardar o efeito útil do recurso. Assim sendo, se é esta uma das normas que o recorrente pretende fazer sindicar pelo Tribunal Constitucional, torna-se claro que não basta ao Tribunal recorrido, para fundamentar a retenção do recurso de constitucionalidade sobre o despacho que decidiu relegar para final a apreciação esse mesmo recurso, dizer que, por se estar em “fase de recurso”, se mantém o regime que esse mesmo Tribunal decidiu atribuir ao recurso ordinário, cuja apreciação lhe era requerida e que foi igualmente relegada para final, assim se esquecendo qualquer análise sobre a manutenção do efeito útil do recurso de constitucionalidade. Ora, quanto ao fundamento da inconstitucionalidade normativa invocada, importar salientar o seguinte, para que dúvidas não fiquem sobre a pertinência da questão colocada: O princípio “ ne bis in idem ” é consagrado no artigo 29.º, n.º 5, da CRP, que dispõe que: Ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime”. Este princípio “(...) comporta duas dimensões: (a) como direito subjetivo fundamental, garante ao cidadão o direito de não ser julgado mais do que uma vez pelo mesmo facto, conferindo-lhe, ao mesmo tempo, a possibili­ dade de se defender contra atos estaduais violadores deste direito (direito de defesa negativo); (b) como princípio constitucional objetivo (dimensão objetiva do direito fundamental), obriga fundamentalmente o legislador à con­ formação do direito processual e à definição do caso julgado material, de modo a impedir a existência de vários julgamentos pelo mesmo facto. Para a tarefa de «densificação semântica» do princípio é particularmente importante a clarificação da expressão «prática do mesmo crime», que tem de obter-se recorrendo aos conceitos jurídicos-processuais e jurídico-materiais desenvolvidos pela doutrina do direito e processo penais. O problema pode não ser fácil nos casos de compartici­ pação, de concurso de crimes e de crime continuado (cfr. artigos 28.º e segs. do Cód. Penal). A Constituição proíbe rigorosamente o duplo julgamento e não a dupla penalização, mas é óbvio que a proi­ bição do duplo julgamento pretende evitar tanto a condenação de alguém que já tenha sido definitivamente absolvido pela prática da infração, como a aplicação renovada de sanções jurídico-penais pela prática do «mesmo crime».”. Conforme se decidiu no douto despacho proferido pelo Tribunal de 1.ª Instância, datado de 4.03.2016, que inicialmente atribuiu o regime de subida imediata e efeito suspensivo ao recurso ordinário interposto pelo Arguido, ora Reclamante: Normalmente essa inutilidade não ocorre ainda que o provimento do recurso implique a anulação de atos processuais já realizados.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=