TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

542 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Aquando da revisão levada a cabo pela Lei n.º 25/95, o conceito de gestor público vigente no ordena­ mento jurídico era ainda o previsto no Decreto-Lei n.º 464/82, de 9 de dezembro. Tratava-se de um conceito restritivo de gestor público, que reservava tal qualidade aos indivíduos nomeados pelo Governo para os órgãos de gestão das empresas públicas ou para os órgãos de gestão das empresas em que a lei ou os respetivos estatutos conferissem ao Estado essa faculdade (cfr. artigo 1.º, n.º 1). E de que se encontravam expressamente excluídos «os indivíduos designados por eleição para os órgãos de gestão das sociedades de capitais públicos ou participadas» (artigo 1.º, n.º 3). O conceito de empresa pública era, por seu turno, o que constava do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de abril, sendo integrado apenas pelas «empresas criadas pelo Estado, com capitais próprios ou fornecidos por outras entidades públicas para exploração de atividades de natureza económica e social» (artigo 1.º, n.º 1), dotadas de formas de gestão específicas caracterizadas pela tutela económica e financeira exercida pelo Governo (cfr. artigos 12.º a 14.º). Excluídas do conceito de empresas públicas estavam então as «sociedades de capitais públicos» – definidas no n.º 2 do artigo 48.º como «sociedades constituídas em conformidade com a lei comercial, associando o Estado e outras entidades públicas dotadas de personalidade de direito público ou de direito privado» −, bem como as «sociedades de economia mista» – definidas no mesmo lugar como «sociedades constituídas em conformidade com a lei comercial, em que se associam capitais públicos e privados nacionais ou estrangeiros». Ora, foi justamente em razão das limitações inerentes aos conceitos de gestor público e de empresa pública que vigoravam à data no ordenamento jurídico − e da consequente impossibilidade de, mediante a exclusiva convocação dos mesmos, assegurar que o elenco dos sujeitos onerados com o dever de declarar os respetivos património, rendimentos e cargos sociais teria a abrangência ditada pelo imperativo de transparência na gestão de recursos públicos que constitui o desiderato do regime jurídico de controle público da riqueza − que, no âmbito da revisão levada a cabo pela Lei n.º 25/95, de 18 de agosto, foram equiparados aos titulares de cargos políticos, para os efeitos ali previstos, não apenas os gestores públicos [cfr. alínea a) do n.º 3 do artigo 4.º], como ainda os «administrador[es] designado[s] por entidade pública em pessoa coletiva de direito público ou em sociedade de capitais públicos ou de economia mista.» [alínea b) do n.º 3 do artigo 4.º]. Conforme se afirmou no Acórdão n.º 201/11, «a introdução da alínea b) do n.º 3 do artigo 4.º resul­ tante da Lei n.º 25/95, de 18 de agosto – administrador designado por entidade pública em pessoa coletiva de direito público ou em sociedade de capitais públicos ou de economia mista – em simultâneo com a al. a) – gestor público – explica-se» justamente «pelo propósito de complementar normativamente esta alínea, fazendo ingressar no regime jurídico do controlo público da riqueza em razão do cargo determinada reali­ dade que, não sendo por esta à data comportada, de outro modo ficaria de fora», no caso, «a reportada aos indivíduos designados por eleição para os órgãos de gestão das sociedades de capitais públicos ou participadas sempre que o capital público tivesse tido uma intervenção determinante em tal eleição». Da conjugação da alínea a) com a alínea b) do artigo 4.º, n.º 3, da Lei n.º 4/83, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 25/95, resulta, assim, com toda a clareza, que se pretendeu alargar o universo de indivíduos sujeitos ao dever de entrega da declaração prevista no artigo 1.º, maximizando-se o controle público da riqueza dos gestores de “dinheiros públicos”. Entendeu-se que a necessidade de tal controle não se verificava apenas em relação aos gestores de empresas públicas, como estava previsto na versão originária da Lei n.º 4/83. Face aos imperativos de transparência que constituem a razão justificativa da lei, todos os administradores designados pelo Estado ou outras entidades públicas nas empresas em que detêm partici­ pações (independentemente da natureza jurídica da empresa e de estar em causa a totalidade, a maioria ou uma minoria do capital) deveriam ser por ela abrangidos. São estas as razões que relevam: a participação e a designação públicas. É irrelevante, para os efeitos de transparência da Lei n.º 4/83, se aos indivíduos em questão se aplica ou não o EGP. É neste contexto histórico e sistemático que se deve situar a referência ao conceito de gestor público. 11. Após a revisão levada a cabo pela Lei n.º 25/95, tanto o estatuto dos gestores públicos como o regime jurídico das empresas públicas sofreram profundas alterações.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=