TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

544 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 12. Como resulta do que acaba de expor-se, a remissão para o conceito de gestor público que passou a constar da Lei n.º 4/83, na sequência da revisão levada a cabo pela Lei n.º 25/95, foi sempre realizada, em qualquer uma das versões que aquele diploma foi conhecendo, em atenção ao conteúdo da norma que em cada momento o definiu. Só assim se explica que o legislador tenha recorrido a conceitos complementares sempre que a definição legal de gestor público se revelou insuficiente para assegurar que o elenco dos sujeitos onerados pelo dever de declarar os respetivos património, rendimentos e cargos sociais tinha a abrangência ditada pelas exigências do imperativo de transparência na gestão de recursos públicos que constitui o desi­ derato do regime jurídico de controle público da riqueza. Imperativo esse que tem de ser compreendido em termos muito amplos, segundo a ideia de que a «obrigação de declarar o património, as atividades e funções privadas e os interesses particulares dos titulares de cargos públicos deriva da vontade de moralizar e melhorar a transparência da vida pública», sendo modelada precisamente em função do «levantamento dos casos em que os interesses privados podem afetar a atuação dos homens públicos» (cfr. nota justificativa inserta no projeto-lei 561/VI, um dos quatro que estiveram na génese da Lei n.º 25/95). Foi em face destas alterações do regime, assim contextualizadas, e apenas em face delas, que o Tribunal Constitucional entendeu interpretar o conceito de gestor público constante da Lei n.º 4/83 por referência ao EGP sucessivamente em vigor. Admitiu mesmo, no Acórdão n.º 279/10, que, a partir da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de março (embora ressalvando, naturalmente, as regras de aplicação da lei no tempo), o conceito deveria ser preenchido por referência à definição constante do artigo 1.º deste diploma – independentemente, portanto, de qualquer alteração à Lei n.º 4/83 posterior à efetuada pela Lei n.º 25/95 (no âmbito em questão, tal alteração veio apenas a verificar-se com a nova redação do artigo 4.º, n.º 3, efetuada pela Lei n.º 38/2010, de 2 de setembro). Já no Acórdão n.º 242/11 (a que depois aderiram os Acórdãos n. os 49/12 e 44/13), o Tribunal veio dizer que, «[q]uanto à previsão da alínea a) , a densificação do conceito de gestor público só poder[ia] ser efetuada em termos correspondentes àqueles que constam do Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de março, por ser esta a normação vigente já no ordenamento jurídico aquando das alterações introduzidas pela Lei n.º 38/2010, de 2 de setembro». 13. Ao abrigo do disposto no artigo 1.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 71/2007, na versão resultante do Decreto-Lei n.º 39/2016, de 28 de julho, o EGP não se aplica aos membros do Conselho de Administra­ ção da CGD Porém, e como resulta da reconstituição da respetiva história legislativa, o preenchimento do conceito de gestor público para efeitos da Lei n.º 4/83 não se encontra vinculado, de um modo absoluto ou incondicional, ao conceito que releva no âmbito do EGP, em especial no âmbito subjetivo deste último. Pelo contrário, a relação entre os conceitos de gestor público em ambos os diplomas sempre se estabeleceu com base no pressuposto de que a definição constante do EGP teria a virtualidade de assegurar a plena con­ gruência entre o elenco dos sujeitos que a lei quer onerar com o dever de declarar os respetivos rendimentos, património e cargos sociais e o imperativo de transparência na gestão de recursos públicos que constitui o desiderato do regime jurídico de controle público da riqueza. Acresce não haver qualquer razão para supor que o Decreto-Lei n.º 39/2016 procurou modificar esse estado de coisas. De acordo com o seu preâmbulo, «[i]mpõe-se um ajustamento do estatuto dos titulares dos órgãos de administração que seja apto para alcançar o objetivo de maior competitividade das institui­ ções de crédito públicas, sem perda de efetividade do controlo exercido sobre os respetivos administradores, preocupação que se encontra acautelada pela regulação hoje aplicável a qualquer instituição de crédito». Considerou-se, portanto, que as instituições de crédito públicas abrangidas pela exceção introduzida no artigo 1.º, n.º 2, do EGP seriam mais competitivas se os seus administradores não estivessem sujeitos às obri­ gações e aos constrangimentos do mesmo EGP. Tal ganho de competitividade não implicaria, além do mais, qualquer perda de efetividade do controle exercido sobre os respetivos administradores, devido à «regulação particularmente intensa, tanto a nível europeu, como nacional», incidente sobre a atividade das instituições de crédito, em especial das qualificadas como «entidades supervisionadas significativas».

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