TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

546 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL que o Estado não se limita a exercer influência dominante – pura e simplesmente, detém a totalidade do capital social – não estariam sujeitos a tais deveres. E chegar-se-ia a tal subversão valorativa não a partir de uma decisão clara do legislador nesse sentido – concretizada através de uma alteração à Lei n.º 4/83 ou, ainda que assim não acontecesse, resultando comprovadamente tal intenção de outra norma do ordenamento jurí­ dico –, mas reflexamente, atribuindo-se caráter decisivo a uma alteração pontual a outro diploma, o EGP. Manifestamente, uma novação legislativa animada por outros desígnios e, por via disso, a projetar-se em comandos normativos alheios aos problemas da transparência. Ora, tal subversão dos valores da Lei n.º 4/83 é insustentável face aos elementos interpretativos a relevar neste contexto. Os elementos histórico – o progressivo alargamento do elenco das entidades abrangidas pela Lei n.º 4/83 – e sistemático/teleológico – a coerência da alínea a) com a alínea b) do n.º 3 do artigo 4.º, tendo em conta as finalidades prosseguidas pela lei em questão – imporiam aqui sempre outra interpretação do conceito de gestor público. Este poderá ser mais ou menos abrangente, mas deverá incluir, no mínimo, todos os gestores de empresas públicas. Uma interpretação que, de resto e como referido anteriormente, tem também por si a força unívoca e não despicienda do próprio teor literal dos preceitos a que, no seu conjunto, pode pedir-se a resposta ao problema que aqui nos ocupa. É de concluir, portanto, que os membros do Conselho de Administração da CGD, ainda que tenham assumido funções numa data posterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 39/2016, se encontram sujei­ tos ao dever de apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais estabelecido no artigo 1.º da Lei n.º 4/83. III – Decisão 15. Nos termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide que, em relação ao iní­ cio de funções como membros do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos, S. A., em 31 de agosto de 2016, A., B., C., D., E., F., G. H., I., J., e K. se encontram sujeitos, por força da Lei n.º 4/83, de 2 de abril, na redação conferida pela Lei n.º 38/2010, de 2 de setembro, ao dever de apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais estabelecido no artigo 1.º do mesmo diploma. Consequentemente, determina-se que os notificados que ainda não apresentaram a sua declaração sejam notificados para tal efeito, nos termos do artigo 3.º, n.º 1, do referido diploma. Lisboa, 1 de fevereiro de 2017. – Teles Pereira – Maria de Fátima Mata-Mouros – Joana Fernandes Costa – Catarina Sarmento e Castro – Pedro Machete – João Pedro Caupers (com declaração em anexo) – Lino Rodri- gues Ribeiro – Fernando Vaz Ventura – Maria Clara Sottomayor – Gonçalo Almeida Ribeiro – Maria José Rangel de Mesquita – Claudio Monteiro – Costa Andrade. DECLARAÇÃO DE VOTO Não obstante ter subscrito a decisão e ela não me merecer quaisquer reservas, julgo fazer sentido chamar a atenção para um ponto que não foi objeto de referência no Acórdão. Na lógica do texto aprovado, as objeções a uma interpretação do Decreto-Lei n.º 39/2016, de 28 de julho, na parte em que aditou ao artigo 1.º do Estatuto do Gestor Público um n.º 2, de que supostamente decorreria a exoneração dos administradores da CGD do dever de apresentação de declaração de património e rendimentos, assentam fundamentalmente naquilo que aparece designado no texto como uma “insusten­ tável subversão valorativa”, iluminada por razões de coerência do sistema jurídico nacional e por imperativos de transparência.

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