TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

561 acórdão n.º 99/17 2. Em primeiro lugar, o direito ao recurso não consome o direito ao contraditório, particularmente naqueles casos em que a instância de recurso tem poderes de cognição mais limitados do que a instância recorrida, como sucede no caso presente (cfr. o artigo 103.º-C, n.º 8, da LTC). A solução adotada pela maioria nos pontos 7 e 8 tem como consequência a eliminação da instância de recurso. Acresce que a mesma solução, ao impedir que os autores se pronunciem sobre as questões que o Tribunal ex officio determinou como relevantes para a sua decisão, é tributária de uma visão demasiado limitada – e hoje ultrapassada – do princípio do contraditório. Como se referiu no Acórdão n.º 510/15: «É assente, na jurisprudência constitucional, que do conteúdo do direito de defesa e do princípio do contra­ ditório resulta prima facie que cada uma das partes deve poder exercer uma influência efetiva no desenvolvimento do processo, devendo ter a possibilidade, não só de apresentar as razões de facto e de direito que sustentam a sua posição antes de o tribunal decidir questões que lhes digam respeito, mas também de deduzir as suas razões, oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e tomar posição sobre o resultado de umas e outras (cfr. designadamente, os Acórdãos. n. os 1185/96 e 1193/96). A jurisprudência adota, assim, um entendimento amplo do contraditório, entendido “como garantia da parti­ cipação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objeto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão” (Lebre de Freitas, Introdução ao processo civil: conceito e princípios gerais. Coimbra, Coimbra Editora, 1996, p. 96.). Adianta ainda este autor que “o escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à atuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de incidir ativamente no desenvolvimento do processo.”» 3. Quanto às três questões tidas no ponto 11 do Acórdão como fundamentais para decidir o presente recurso, cumpre dizer: 3.1. A aludida insatisfação no plano metódico resulta de, por um lado, a maioria não esclarecer – e, por conseguinte, também não fundamentar – a pertinência da aplicação do normativo mais desfavorável e menos adequado à matéria disciplinar – ou seja, o Regulamento do Conselho de Jurisdição Nacional do PSD: o respetivo maior afastamento relativamente à matéria em causa no presente prende-se com a circunstância de tal órgão decidir sobre muitas outras matérias para além da disciplinar (cfr. o artigo 28.º, n.º 2, dos Estatutos do PSD – nem, tão-pouco, os termos do que considera ser uma «aplicação conjugada» de tal normativo com o Regulamento de Disciplina. Por outro lado, e independentemente da fonte concretamente mobilizada, a decisão também não justifica minimamente a existência de uma lacuna, a integrar com recurso a fontes subsidiárias: com efeito, se a «notificação» da sanção disciplinar não foi realizada nos termos normativamente previstos, porquê considerá-la realizada de todo em todo? Qual o interesse normativo que justifica o respetivo aproveitamento? 3.2. A inconsistência jurídica da decisão traduz-se, desde logo, na utilização para determinação do início de contagem de um prazo substantivo – como é o caso daquele que a lei confere para intentar uma dada ação judicial – de normas processuais civis atinentes à notificação e à citação, que pressupõem a existência de um processo já pendente e que, por isso mesmo, são determinantes para o início da contagem de prazos processuais. Mas, mais grave ainda, é a consequente inversão da posição processual dos autores: estes, em vez de serem tratados como aquilo que são – autores –, veem ser-lhes aplicadas normas predispostas para os réus. E o resultado inelutável é o benefício do infrator: o partido, que não respeitou as regras por si próprio

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