TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

571 acórdão n.º 178/17 Das normas citadas – designadamente do referido n.º 3 – resulta evidente que a deliberação de avocação adotada pela Comissão Política Nacional em 16 de janeiro de 2017 encontra fundamento nos Estatutos do Partido Socialista. Ademais, é irrelevante que, à data da avocação, já a Comissão Política Concelhia de Fafe tivesse deliberado no sentido de designar Antero Barbosa como candidato do partido à Câmara Municipal de Fafe, uma vez que a avocação pode operar “[…] para deliberação ou ratificação”, tornando claro que a escolha da Comissão Política Concelhia não é definitiva, no caso de a Comissão Política Nacional pretender ter a última palavra e avocar as designações. Aqui chegados, cumpre referir que o âmbito do controlo a realizar pelo Tribunal Constitucional quanto a esta deliberação – no quadro de referência já assinalado como princípio da intervenção mínima – prati­ camente se esgota neste plano de validade estatutária da avocação, porquanto outras dimensões da mesma deliberação encerram caráter decisivamente político. Assim, não pode a presente impugnação servir como meio para direta ou indiretamente sindicar o ato político de escolha dos candidatos à presidência de câmaras municipais, que pertence claramente à vida interna do partido, com plena autonomia deste. O respeito por tal autonomia leva a que não se considere relevante a argumentação do Impugnante, no sentido de ver nas palavras do atual presidente da Câmara Municipal de Fafe, uma declaração vinculativa. Com efeito, para além de ser descabido o enquadramento de tais palavras como declarações negociais – quando não existe, nem o contexto em causa impõe ou sequer sugere, um específico e claro negócio jurídico, que só existiria, por exemplo, perante um regime legal de renúncia abdicativa prévia à candidatura ao cargo –, todo o sentido dos acontecimentos anteriores à reunião da Comissão Política Concelhia e no decurso desta, quanto à “disponibilidade” dos candidatos, têm natureza marcadamente, e inapagavelmente, política, só podendo ser valorados nesse plano, que não cabe ao Tribunal Constitucional sindicar. Por outro lado, o Congresso Nacional do Partido Socialista “[…] é o órgão de apreciação e definição das linhas gerais da política nacional do Partido” (artigo 55.º, n.º 1, dos Estatutos do Partido Socialista). Nesta previsão cabe, claro está, a fixação de orientações políticas para candidaturas, designadamente a da recandi­ datura de atuais presidentes de câmara, enquanto elemento de uma certa estratégia política. Ao contrário do afirmado pelo impugnante, não resulta da deliberação da Comissão Política Nacional nem da deliberação impugnada da Comissão Nacional de Jurisdição que aquela orientação assuma “caráter imperativo e normativo” – no sentido de insensível à modelação por circunstâncias concretas –, mas apenas que foi a necessidade de garantir, no caso concreto, a referida orientação que fundamentou a avocação, o que – para além de coerente com o que foi deliberado no Congresso Nacional – não representa mais do que o meio, estatutariamente legítimo, que o partido encontrou para assegurar a execução regular das orienta­ ções políticas gerais fixadas. Já a escolha do candidato Raul Cunha, subsequente à avocação, é, em si mesma, insindicável pelo Tribunal Constitucional, pelas razões já amplamente referidas. A este propósito, não tem cabimento a invocada violação da igualdade de oportunidades e imparciali­ dade no tratamento de candidaturas, do direito à participação na vida pública ou da liberdade de associação. Manifestamente, nenhuma das normas convocáveis a este respeito resulta violada, no contexto de facto dado como provado, uma vez que os mencionados princípios não se opõem a que a participação dos cidadãos se desenvolva no quadro de um regime estatutário próprio dos partidos, que sempre terá como dimensão irre­ dutível a autonomia de escolha dos candidatos a cargos políticos. Fora de um quadro excecional de evidente ou ostensiva discriminação ou de violação de direitos constitucionalmente consagrados de participação na vida política – que não se antevê, porque não resultou provado, nem sequer suficientemente alegado –, a escolha de um candidato segundo certos critérios políticos, envolvendo necessariamente a “não escolha” de outros potenciais interessados nesses mesmos cargos, não pode reconduzir-se, sem mais, a ilegítima violação da igualdade de oportunidades e imparcialidade no tratamento de candidaturas, do direito à participação na vida pública ou da liberdade de associação, tanto mais quando, como é o caso, as opções são tomadas no âmbito do regular funcionamento dos órgãos do partido político.

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