TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

66 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL um pressuposto de validade do ato normativo em que se integram essas normas e, portanto, uma questão prévia a resolver pelo Tribunal no quadro da sua apreciação. Sobre este aspeto pronuncia-se expressamente Jorge Miranda, salientando os poderes de cognição do Tribunal Constitucional em situações deste tipo: «Requerida a apreciação da constitucionalidade ou da legalidade de uma norma, nada impede que o Tribunal Constitucional aprecie também a de outra, nela implícita ou contida. Na fiscalização sucessiva, o Tribunal deve conhecer das inconstitucionalidades consequentes, quando a sua enunciação, embora não explicitada, resulte de todo indissociável de uma apreciação global do pedido. O artigo 51.º, n.º 5, da Lei n.º 28/82, sistematicamente entendido, permite tal conhecimento. Tal como parece poder responder-se positivamente ao problema simétrico: chamado a apreciar a inconstitucio- nalidade ou a ilegalidade de uma norma que se funda noutra norma legal (por exemplo, a norma de um decreto-lei autorizado, o qual pressupõe lei de autorização), ele pode também apreciar esta segunda norma, desde que haja uma relação necessária entre uma e outra.» (vide Autor cit., Manual de Direito Constitucional, tomo VI, 4.ª edi- ção, Coimbra Editora, Coimbra, 2013, pp. 301-302). O próprio Tribunal, no seu Acórdão n.º 624/97, também admitiu expressamente essa possibilidade (ainda que, no caso, estivesse em causa um processo de fiscalização da legalidade, e não de constituciona- lidade): «[T]endo o Tribunal Constitucional [(…)] o poder-dever de não considerar, nos processos de fiscalização abstrata de legalidade de normas, previstos nas alíneas b) , c) e d) do n.º 1 do artigo 281.º da Constituição, como parâmetros de aferição dessa mesma legalidade, leis com valor reforçado, leis gerais da República ou disposições dos estatutos das regiões autónomas que colidam com a Constituição, deve o Tribunal Constitucional, no âmbito dos referidos processos, recusar, como questão prejudicial, a essas mesmas normas o valor de padrão ou de parâmetro aferidor do juízo de legalidade, sempre que elas sejam inconstitucionais [(…)].» Por força do disposto no artigo 51.º, n.º 5, da LTC, tem, portanto, o Tribunal Constitucional com- petência para conhecer da questão prévia sub iuditio atinente à disciplina introduzida pela Lei n.º 4/2017. Saliente-se, ainda, que a validade da mesma não só é assumida pelo requerente como, mesmo que tal não sucedesse, este não teria competência para suscitar a fiscalização sucessiva da respetiva constitucionalidade, atenta a legitimidade que decorre do disposto no artigo 281.º, n.º 2, alínea g) , da Constituição; tal como não teve legitimidade para desencadear um processo de fiscalização preventiva em relação ao decreto – o Decreto n.º 55/XIII – que antecedeu a Lei n.º 4/2017, atento o disposto no artigo 278.º, n.º 2, da Constituição. Assim, e atendendo à cadeia normativa que se apresenta nos autos de acordo com a perspetiva assumida pelo órgão autor da norma – em que a validade das normas do artigo 8.º, n.º 3, é necessariamente condicio- nada pela existência e validade das normas do artigo 2.º da Lei n.º 4/2017, na parte em que altera o artigo 5.º, n.º 8, da Lei n.º 19/2003, e do artigo 5.º do mesmo diploma, que confere eficácia retroativa à referida alteração – o não conhecimento de tal questão prévia implicaria, além de uma omissão de pronúncia, não só a mencionada diminuição dos poderes do Tribunal Constitucional em sede de garantia da Constituição, como uma restrição da própria legitimidade do requerente, no que se refere à fiscalização preventiva de nor- mas constantes de decretos legislativos regionais que lhe tenham sido enviados para assinatura. 19. Os problemas de constitucionalidade mais evidentes colocados pela atribuição às Assembleias Legis- lativas das regiões autónomas da competência para fixar a quantia em dinheiro a atribuir aos partidos nelas representados, a título de financiamento público aos partidos políticos, nos termos do artigo 5.º, n.º 8, da Lei n.º 19/2003, na redação dada pela Lei n.º 4/2017, resultam da essencialidade de tal competência para a definição da subvenção em causa.

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