TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

77 acórdão n.º 176/17 27.2. Questão diversa, e que pode suscitar dúvidas no caso em apreciação, é a de saber se, integrando a figura do “antigo deputado” o estatuto dos Deputados à Assembleia da República – e, nessa medida, sendo abrangida pela equiparação prevista no artigo 24.º, n.º 8, do EPARAM –, e sendo o estatuto dos deputa- dos das assembleias legislativas das regiões autónomas matéria de reserva estatutária (artigo 231.º, n.º 7, da Constituição), ainda há espaço para uma autónoma intervenção do legislador regional, nos termos intencio- nados pelo autor do Decreto. Recorde-se a posição Gomes Canotilho e Vital Moreira acima transcrita: ao reservar explicitamente para o estatuto regional a definição do estatuto dos titulares dos órgãos regionais, a Constituição não deixa por isso margem para dúvidas de que «tal matéria não cabe na competência legislativa regional, através de decreto legislativo regional» (cfr. supra o n.º 25). Na verdade, inexistindo tal espaço, o artigo 48.º-A, do Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, aditado pelo artigo 2.º do Decreto, invadiria a aludida reserva estatutária e, consequentemente, teria de ser considerado inconstitucional, por dispor sobre matéria reservada à competência legislativa da Assembleia da República [cfr. o artigo 227.º, n.º 1, alínea a) , com referência ao artigo 161.º, alínea b) , ambos da Constituição]. 27.2.1. Todavia, são os mesmos Autores que formulam um princípio de resposta: «nada parece impedir que os estatutos – que não podem “delegar” essa matéria em decreto regional – sejam “regulamentados” por diploma regional» ( ibidem ). No mesmo sentido, Rui Medeiros sublinha que o princípio da reserva estatutária decorrente do artigo 231.º, n.º 7, da Constituição não deve ser «absolutizado, não se podendo olvidar que, não apenas por razões pragmáticas, mas também por força da dignidade normativa e da rigidez da lei estatutária, não se deve exigir dos estatutos uma regulamentação exaustiva e de pormenor desta matéria de reserva estatutária» (cfr. Rui Medeiros/Tiago Fidalgo de Freitas/Rui Lanceiro, Enquadramento, pp. 46-47, cit. apud Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, tomo III, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, anot. IX ao artigo 231.º, p. 410). De resto, é isso mesmo que se encontra previsto, com referência às necessárias adaptações, no artigo 97.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (cfr. supra o n.º 26). Com efeito, nos termos desse preceito, o Estatuto dos Deputados à Assembleia da República também é aplicável aos deputa- dos à Assembleia Legislativa no que se refere aos direitos, regalias e imunidades constitucional e legalmente consagrados, «com as necessárias adaptações». E estas, consoante o que estiver em causa, podem natural- mente ser realizadas por via normativa, mediante a aprovação de decretos legislativos regionais. 27.2.2. A equiparação estatutária prevista no artigo 24.º, n.º 8, do EPARAM deve, assim, ser entendida como um princípio que não impõe a uniformidade nem a identidade das soluções por ela abrangidas. Aliás, nem tal seria conciliável com o princípio da subsidiariedade (artigos 6.º, n.º 1, da Constituição, e 11.º do EPARAM) ou com o poder de auto-organização próprio das assembleias, para mais tratando-se – como sucede no caso da ALRAM – de um órgão representativo dotado de legitimidade democrática direta. A referida equiparação significa, justamente, o reconhecimento, por parte do legislador estatutário, da igual dignidade democrática das duas assembleias e dos seus membros: a atribuição aos deputados da ALRAM dos direitos, regalias e imunidades atribuídos aos Deputados à Assembleia da República pelo respetivo estatuto, funda-se na equiparação dos primeiros aos segundos. E tal equiparação coenvolve o reconhecimento da dig- nidade própria da ALRAM, enquanto Assembleia Legislativa de uma região autónoma. Deste modo, é de entender que, salvaguardadas as opções de princípio e as escolhas primárias – como, por exemplo, a criação de um estatuto do “antigo deputado” ou a previsão de assembleias de interesse parla- mentar constituídas por tais deputados – realizadas pela lei da Assembleia da República que defina o estatuto dos seus deputados, o princípio da equiparação estatutária consagrado no artigo 24.º, n.º 8, do EPARAM habilita a ALRAM, no exercício do seu poder de auto-organização, e sob a forma de decreto legislativo regio- nal, a aprovar ajustamentos e adaptações ao regime dos direitos, regalias e imunidades previsto na citada lei

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