TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 98.º volume \ 2017

87 acórdão n.º 176/17 3. Não é esse, porém, o sentido dos referidos preceitos legais pressuposto no pedido, o qual – como acima já se referiu –, é bastante para que seja proferida uma pronúncia de inconstitucionalidade. Para além disso, a interpretação contraposta pelo autor do preceito não apresenta a virtualidade de afastar uma pronún- cia de inconstitucionalidade. Efetivamente, a inconstitucionalidade orgânica de uma norma, concretamente por falta de atribuição ao órgão legislativo de competência para a produzir, não pode ser sanada pela atribui- ção de eficácia retroativa à competência posteriormente atribuída. Reitera-se aqui o entendimento de que os vícios de natureza orgânico-formal de uma norma legal se aferem pelas normas de competência e de forma vigentes no momento da sua emissão, sendo, em princípio, irrelevantes quaisquer alterações supervenientes de parâmetro (cfr., por exemplo, o Acórdão n.º 246/05, ponto 5; embora o aresto se refira à alteração de parâmetro constitucional, o mesmo raciocínio é aplicável no caso). 4. Irrelevante se torna, assim, avaliar a conformidade constitucional do artigo 5.º, n.º 8, da Lei n.º 19/2003, na redação dada pela Lei n.º 4/2017, uma vez que a norma objeto do pedido sempre seria inconstitucional, independentemente da interpretação proposta pelo autor da norma. Por esta razão não acompanho o Acórdão na parte em que alargou o âmbito do presente processo de fiscalização preventiva do Decreto Regional à apreciação da Lei n.º 4/2017, que é uma lei da República. – Maria de Fátima Mata- -Mouros. DECLARAÇÃO DE VOTO Não acompanho o sentido da decisão do Tribunal no que respeita à pronúncia de a inconstitucionali- dade da norma constante do artigo 8.º, n.º 3, do decreto legislativo regional em causa, na parte em que atri- bui natureza interpretativa ao disposto no artigo 47.º, n.º 1, do Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro, por violação do artigo 227.º, n.º 1, alínea a) , da Constituição da República Portuguesa. Na base da minha dissensão está o entendimento de que a Assembleia da República podia, como fez, atribuir às assembleias legislativas das regiões autónomas competência para, dentro dos parâmetros que fixou, determinar, por via de decreto legislativo regional, o valor das subvenções a pagar aos partidos políticos repre- sentados naquelas assembleias, por conta do seu próprio orçamento. O objetivo da norma do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição é impedir que a regulação legal primária de determinadas matérias ou aspetos substanciais do seu regime jurídico seja exercida, concorrentemente, por órgãos legiferantes, nacionais e regionais, em termos que possam implicar a adoção de regimes jurídicos conflituantes (cfr., neste sentido, Acórdão n.º 26/09). Por isso, as regiões autónomas carecem de poderes legislativos em matérias que a Lei Fundamental reserva aos órgãos legislativos da República, conforme dispõe a alínea a) daquele preceito. Tratando-se, porém, como no caso, de uma opção legislativa do órgão com competência para a tomar, julgo não só legítimo, se não mesmo constitucionalmente imposto, que, no respeito devido à autonomia financeira das regiões autónomas [artigos 227.º, n.º 1, alínea j) , e 232.º, n.º 1, da Constituição], o legislador da República confira às assembleias legislativas destas regiões o poder de determinar, dentro daqueles parâ- metros, os montantes das subvenções a pagar aos partidos políticos nelas representados. Não se olvide que, por um lado, se trata de uma competência atribuída por lei aprovada por um órgão legislativo de natureza parlamentar a outros órgãos legislativos da mesma natureza (a minha posição seria bem outra se a competência tivesse sido atribuída aos governos regionais); por outro, que seria insólito, do ponto de vista da autonomia regional, que um aspeto da organização interna de um órgão regional – o mais importante órgão regional –, com repercussão financeira exclusiva no respetivo orçamento, fosse direta e completamente regulado por um órgão de soberania da República. Não julgo, nesta linha de raciocínio, existir qualquer transferência de poderes, mas, antes, uma partilha de competências, que, sendo justificada e imposta pelo próprio princípio da autonomia financeira das regiões

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