TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
248 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – Assim, é estabelecida na lei uma necessária diferenciação entre o juiz (secção regional) que aprova o relatório de auditoria e o juiz (secção regional) que julga e profere a sentença em 1.ª instância (condenatória ou absolutória), o que não se mostra diferente da solução adotada na distribuição de competências entre as três secções especializadas do Tribunal de Contas, reservando-se à 3.ª Secção o poder de julgar e decidir a ação de responsabilidade financeira; por outro lado, o legislador comete ao juiz regional territorialmente competente para aprovar o relatório de auditoria a competência para proceder à citação dos demandados para apresentação da contestação, distribuindo posteriormente o processo ao outro juiz regional. IV – O princípio do juiz natural – do qual decorre a proibição de desaforamento da causa criminal em relação ao juiz pré-determinado por lei –, para além da relevância no domínio da justiça penal, não deixa de se projetar, enquanto emanação do princípio do Estado de direito e garante da independência e imparcialidade dos tribunais, em todos os tribunais, independentemente da natureza da causa que lhes é submetida; com este alcance, pois fundado no princípio do Estado de direito democrático e projetado nas garantias de independência e imparcialidade dos tribunais, o princípio constitucional do juiz natural afigura-se, prima facie , convocável no caso dos autos, mesmo atenta a natureza – não penal – das causas em juízo. V – O regime normativo ora questionado, seja na opção de distribuição de competências a dois distintos juízes, seja na específica configuração das competências cometidas a cada um desses juízes, não con- tende com nenhuma das exigências decorrentes do princípio do juiz natural; a opção normativa em crise não configura uma situação de desaforamento constitucionalmente proibida ao distinguir o juiz do julgamento do juiz interveniente na fase anterior do processo de efetivação de responsabilidades financeiras. VI – Diversamente, a referida distinção das competências cometidas a cada uma das instâncias judiciais regionais é feita por via de regras pré-definidas e suficientemente determinadas, estando garantido que nenhuma causa apreciada no âmbito de processo de efetivação de responsabilidades financeiras seja julgada por um tribunal criado ad hoc para esse efeito, por um tribunal excecional ou por um tribunal designado discricionariamente; as regras estabelecidas na lei definem com clareza as competências dos juízes regionais no âmbito dos processos jurisdicionais de efetivação de responsabilidades finan- ceiras, determinando-se o tribunal competente segundo critérios gerais e objetivos, não dependentes de quaisquer circunstâncias específicas do caso, cabendo ao juiz da secção regional territorialmente competente a aprovação do relatório de auditoria (com base no qual entidade terceira, maxime o Ministério Público, intenta a ação de responsabilidade financeira), sendo responsável pela tramitação do processo até à fase da contestação pelos demandados, cabendo ao juiz da outra secção regional dirigir a audiência de julgamento, ponderando a prova produzida, e julgar a causa, condenando (ou absolvendo) os demandados no pagamento de sanção pecuniária pelo ilícito financeiro (responsabi- lidade sancionatória) ou na restituição dos montantes a repor (responsabilidade reintegratória); deste modo, o princípio do juiz natural (ou do juiz legal) seja na sua vertente positiva, seja na sua vertente negativa, mantém-se intocado e o mesmo se diga quanto às vertentes objetiva e subjetiva (garantística) do princípio. VII – Mostra-se cumprida a exigência de que a identificação da concreta formação ou instância judiciária que vai julgar o processo (e, antes, que vai aprovar o relatório com base no qual a ação é interpos- ta) seja feita pela aplicação de regras, gerais, abstratas e suficientemente precisas, segundo critérios
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