TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

284 regras, gerais, abstratas e suficientemente precisas, segundo critérios objetivos de distribuição das competências (vertente positiva), mostra-se cumprida; do mesmo passo, as regras em causa não são susceptíveis de afasta- mento num caso individual, impedindo-se, assim, a arbitrariedade na atribuição de um concreto processo a juiz determinado e a escolha individualizada do tribunal competente para cada caso (vertente negativa). Por outro lado, a definição, prévia, determinada, objetiva, das competências dos diferentes juízes nas diferentes fases do processo de efetivação de responsabilidades financeiras não deixa de constituir uma impor- tante garantia da independência e imparcialidade dos juízes responsáveis pela condução e, sobretudo, decisão do processo em causa (como também se verá na análise dos parâmetros constitucionais especificamente dirigidos à garantia da independência dos juízes, à imparcialidade do julgamento e às garantias de defesa, a que os recorrentes apelam). Tais conclusões não são postas em causa pela alegação dos recorrentes no sentido de que «é insuficiente para a observância do princípio do juiz natural o facto das normas dos n. os 1 e 2 do artigo 108.º da LOPTC preverem, de modo geral e abstracto, as regras quanto à designação do juiz do processo». Diferentemente, as diversas virtualidades do princípio do juiz natural – maxime tratando-se de processos jurisdicionais de natureza não penal (sejam de responsabilidade financeira reintegratória ou sancionatória) e, em parte, não sancionatória (no caso da estrita responsabilidade reintegratória) – não se mostram afetadas, antes garantidas pela previsão, geral e abstrata, das regras de designação do juiz do processo contidas no artigo 108.º (n. os 1 e 2, como alegado, ou n. os 2 e 3, como impugnado). Improcede, assim, a invocada violação do princípio do juiz natural – também enquanto emanação do princípio do Estado de direito e garante da independência e imparcialidade dos juízes –, não cabendo à sua luz um juízo de censura quanto às normas legais objeto do presente recurso de constitucionalidade. 19. Invocam, em sequência, os recorrentes a violação do princípio da independência dos tribunais (artigo 203.º da CRP), na vertente da independência dos Juízes, do direito a uma justiça imparcial, decor- rente do princípio do Estado de direito (artigo 2.º da CRP) e das garantias de defesa por apelo ao disposto no artigo 32.º, n.º 10, da CRP, não apresentando, todavia, qualquer argumentação autónoma quanto à vio- lação individualizada destes princípios – nem tendo sequer a invocação da violação das garantias de defesa sido enunciada no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional (pese embora o parâmetro tenha sido invocado perante o tribunal recorrido e retomado apenas nas alegações de recurso para o Tribunal Constitucional). 19.1. Dispõe o artigo 203.º da Constituição (Independência) que «os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei.» Quanto ao princípio da independência dos tribunais contido neste artigo 203.º da CRP, têm sido assi- naladas duas dimensões principais. A primeira, centrada na autonomia dos órgãos que administram a justiça em face dos órgãos que exercem as demais funções do Estado – independência externa; a segunda, assente na ideia de autonomia de cada tribunal em face dos demais, sem prejuízo das relações de coadjuvação ou de hierarquia estabelecidas na lei – independência interna (neste sentido, cfr. Jorge Miranda/Rui de Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , anotação ao artigo 203.º, vol. III, Coimbra Editora, 2007, pp. 40-41). De todo o modo, o princípio da independência dos tribunais formalmente consagrado na Constituição não se esgota nestas duas dimensões. Do princípio decorre ainda a importante vertente da independência dos juízes, enquanto garantia que não apenas serve os próprios julgadores no exercício das suas funções, como se constitui como uma importante salvaguarda dos cidadãos que recorrem aos tribunais para defesa dos seus direitos ou são alvo de processo judicial, sendo uma condição necessária à obtenção de uma decisão justa e imparcial. Sobre o princípio (sobretudo quanto à vertente da independência dos juízes), escreveu-se no Acórdão n.º 7/12:

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