TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

52 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL pessoas, singulares ou coletivas; apesar de a Constituição afirmar que a todos deve ser garantido o acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos, o artigo 7.º, n.º 3, da Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais (LADT) determina que tal garantia não se aplica certas categorias de sujeitos, nomeadamente às pessoas coletivas com fins lucrativos, independentemente de qualquer ponderação da situação concreta de cada um desses sujeitos; apenas com base na respetiva natureza jurídica, o legislador ordinário exclui certas categorias de sujeitos de uma garantia que a Constituição pretende universal, sendo a contradição valorativa flagrante. IV – Embora não seja exigível neste domínio um tratamento que pura e simplesmente abstraia de todas as diferenças existentes entre os diversos tipos de sujeitos jurídicos nem da relevância que para os mesmos tem a concessão de proteção jurídica enquanto dimensão do direito de acesso aos tribunais e, portanto, como garantia da efetividade da tutela jurisdicional, impõe-se que a projeção de tais dife- renças sobre os critérios de concessão da proteção em apreço não se faça de tal modo que a impeça em absoluto ou de modo desproporcionado; ou seja, para salvaguardar a universalidade do direito à proteção jurídica, é necessário que os critérios em causa sejam adequados e não inviabilizem a possibi- lidade de uma apreciação concreta da situação de insuficiência económica invocada por cada sujeito; na verdade, gozando a categoria de sujeitos correspondente às pessoas coletivas com fins lucrativos do direito fundamental a litigar em juízo, esse direito não pode ser denegado de plano e abstraindo da eventual situação de insuficiência de meios económicos, pois esse é um limite inultrapassável imposto ao legislador na modelação do apoio judiciário. V – Se tais pessoas coletivas com fins lucrativos «podem encontrar-se numa situação de insuficiência eco- nómica que não lhes permita suportar pontualmente os custos de um processo, incluindo o pagamen- to da compensação devida ao patrono», a sua exclusão do direito conferido pela parte final do n.º 1 do artigo 20.º da Constituição tem como consequência que as mesmas fiquem em posição de «não conseguir defender os seus direitos e interesses legalmente protegidos em virtude de não poderem beneficiar da concessão do direito a proteção jurídica»; acresce não ser exato que uma pessoa coletiva com fins lucrativos cuja situação económica não permite custear as despesas de justiça esteja necessa- riamente insolvente, diferentemente, pode uma pessoa coletiva estar «em situação económica difícil, sem apresentar propriamente um passivo muito relevante ou mesmo sequer algum passivo conducen- te à declaração de insolvência, mas, contudo, necessitar da concessão de apoio judiciário para efetivar e executar os seus créditos sobre os seus devedores»; de todo o modo, caso estejam mesmo insolventes, nada justifica o seu afastamento da proteção jurídica, porquanto «todas as pessoas singulares, quer sejam ou não titulares de empresas, estão sob a incidência do regime da insolvência e não se mostram, por isso, genericamente excluídas da proteção jurídica». VI – A norma do artigo 7.º, n.º 3, da LADT limita-se a proibir a concessão de proteção jurídica a toda uma categoria de sujeitos, abstraindo, portanto, da sua situação concreta; na ótica do legislador, o direito à proteção jurídica em causa não é compatível com a natureza das pessoas coletivas com fins lucrativos, estando tais sujeitos, por razões exclusivamente atinentes à sua própria natureza jurídica, excluídos do âmbito de proteção do segmento final do artigo 20.º, n.º 1, da Constituição. VII – O entendimento sustentado no Acórdão n.º 216/10 nos termos do qual as pessoas coletivas com fins lucrativos não são titulares do direito à proteção jurídica consagrado no artigo 20.º, n.º 1, in fine , da Constituição, não se afigura admissível devido, por um lado, à indissociabilidade entre o direito de

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=