TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

522 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL idónea com vista à obtenção de tal benefício não consubstancia, em si mesma, uma medida restritiva de direitos fundamentais; a Constituição permite expressamente a ablação do património dos contribuintes para o preenchimento das finalidades de satisfação das necessidades públicas e de justiça distributiva que comete ao sistema fiscal e, se os cidadãos têm o dever fundamental de pagar impostos, não faz sentido dizer que a tributação do seu património, desde que conforme às exigências constitucionais, consubs- tancia uma restrição do direito fundamental de propriedade; porém, nos casos em que é impugnado o ato de liquidação, é precisamente a adequação constitucional do imposto que é posta em causa e, nessas circunstâncias, a execução da dívida fiscal constitui uma verdadeira restrição do direito de propriedade do impugnante, que sofre uma ablação patrimonial sem que se tenha consolidado na ordem jurídica o juízo sobre o seu dever fundamental de pagar o imposto correspondente. IV – O segundo pressuposto da aplicação do princípio da proibição do excesso é a existência de um fim legí- timo para a medida restritiva; ao admitir a execução de dívidas fiscais, mesmo nos casos em que a liqui- dação seja impugnada, a lei acautela o interesse público e a igualdade de sacrifício, cuja realização ficaria prejudicada na eventualidade de se vir a confirmar o acerto da liquidação do imposto nummomento em que o património do devedor se venha a revelar insuficiente para a satisfação do crédito fiscal. V – A constituição ou prestação de garantia, desde que idónea, permite acautelar as finalidades da execu- ção fiscal de dívidas cuja liquidação é impugnada, com menor sacrifício dos interesses patrimoniais do impugnante; ora, o segundo teste do princípio da proibição do excesso – o subprincípio da neces- sidade – impõe que as restrições de direitos fundamentais se limitem ao mínimo indispensável para a prossecução de finalidades legislativas legítimas, daí que a lei admita a suspensão da eficácia do ato de liquidação nos casos em que a dívida se encontra garantida – nesses casos, seria desnecessário promo- ver uma ablação mais intensa do património do devedor, através da cobrança do imposto. VI – A decisão recorrida não questiona a proporcionalidade, em sentido amplo, da exigência de garan- tia idónea para a suspensão da execução fiscal, não estando em causa a questão de saber se o poder de decisão unilateral da administração fiscal, mitigado por um regime de suspensão da eficácia da decisão mediante a constituição ou prestação de garantia idónea, é um meio adequado, necessário e proporcional de prossecução das finalidades de interesse público e de igualdade tributária que lhe subjazem; em causa está antes a questão de saber se os critérios legais de aferição da idoneidade de uma das modalidades de garantia admitidas – a fiança – são adequados, ou se, pelo contrário, não sendo adequados, são excessivamente restritivos da obtenção do benefício da suspensão da eficácia de ato de liquidação impugnado, situando-se o problema no plano da eventual desnecessidade da ablação do património dos contribuintes, na medida em que um meio igualmente eficaz, mas menos lesivo, do que a execução da dívida fiscal – a prestação de fiança –, não tem a amplitude que teria se a lei acolhes- se critérios adequados de aferição da respetiva idoneidade; com efeito, a eventual desadequação dos critérios de aferição da idoneidade da fiança determina que não haverá lugar a suspensão da execução fiscal em casos em que tal não prejudicaria os fins legitimamente prosseguidos pela lei, sendo essa, verdadeiramente, a questão a decidir no presente recurso. VII – Gozando o legislador de uma ampla liberdade de conformação política na definição das condições em que a fiança deve ser reputada garantia idónea com vista à suspensão da execução fiscal, dadas as fragilidades essenciais deste tipo de garantia, e a legitimidade dos fins que subjazem à possibilidade de execução da dívida fiscal nos casos em que o ato de liquidação seja impugnado, é uma opção do legislador admiti-la através de uma cláusula geral com o teor da parte final do n.º 1 do artigo 199.º

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