TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
634 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – A razão pela qual o Acórdão n.º 728/17, ao invés do que sucedeu com os Acórdãos n.º 674/16 e n.º 675/16, se centrou na apreciação da constitucionalidade, não material mas orgânica, de uma solu- ção normativa em tudo idêntica a qualquer uma daquelas que ali foram julgadas é facilmente expli- cável: uma vez que, tanto o Regulamento Sancionatório do Setor Energético, como o Novo Regime Jurídico da Concorrência, foram aprovados por leis emanadas da Assembleia da República – respeti- vamente, pela Lei n.º 9/2013, de 28 de janeiro, e Lei n.º 19/2012, de 8 de maio –, o Tribunal não se confrontou, nos julgamentos realizados através dos Acórdãos n.º 674/16, n.º 675/16, com quaisquer dúvidas de constitucionalidade orgânica; já o juízo a formular no âmbito dos presentes autos, tendo por objeto a norma do n.º 5 do artigo 67.º dos EERS – integrada em Decreto-Lei governamental não precedido de autorização parlamentar suficiente –, não dispensa a prévia apreciação da validade orgâ- nica da norma sindicada, apreciação essa cujo resultado não poderá deixar de passar pela reiteração da orientação firmada no Acórdão n.º 728/17, de acordo com a qual a norma constante do n.º 5 do artigo 67.º do EERS, com o sentido enunciado na decisão recorrida, é organicamente inconstitucio- nal por violação do regime de competência reservada da Assembleia da República, constante da alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição. IV – Este não é, porém, o único fundamento para a inconstitucionalidade orgânica que atinge a norma sub judice ; o Decreto-Lei n.º 126/2014, que aprovou os EERS, foi editado ao abrigo do disposto no artigo 3.º da Lei n.º 67/2013 e sob invocação da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, que atribuiu ao Governo, no exercício de funções legislativas, competência para «[f ]azer decretos-leis em matérias não reservadas à Assembleia da República», pelo que, estando em causa a amplitude da autonomia legislativa do Governo no domínio contraordenacional, a questão a que cumpre respon- der, em face da alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, consiste em determinar o âmbito do regime geral sujeito à reserva relativa da Assembleia da República. V – O Tribunal Constitucional vem afirmando que o domínio de reserva da competência legislativa par- lamentar é o da definição da natureza do litígio, do tipo de sanções e seus limites máximo e mínimo, bem como das regras gerais do processo, deixando-se à competência concorrente do Governo a defi- nição de cada infração e a cominação da sanção respetiva; a criação de novos tipos de ilícito contraor- denacional encontra-se suportada pela competência concorrencial do Governo, não transgredindo, portanto, em si mesma, a reserva de competência parlamentar. VI – Por força das normas remissivas constantes do artigo 41.º do Regime Geral das Contraordenações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro (RGCO), são, nos termos aí previstos, subsi- diariamente aplicáveis, quer à fase administrativa, quer à fase judicial do processo contraordenacional, as normas de direito processual penal; e ainda que a remissão constante do n.º 1 do artigo 41.º do RGCO não constituísse base suficiente para ter por certo que o efeito suspensivo da impugnação judicial da deci- são condenatória proferida pela autoridade administrativa se encontraria em qualquer caso assegurado, enquanto elemento conformador do regime geral aplicável ao processo contraordenacional, pela previsão constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 408.º do Código de Processo Penal (CPP) – de acordo com a qual «[t]êm efeito suspensivo do processo [o]s recursos interpostos de decisões finais condenatórias» –, o certo é que o próprio RGCO, apesar de não conter nenhum preceito que estabeleça diretamente o efeito suspensivo-regra da impugnação judicial de decisão administrativa sancionatória, não deixa de o pressu- por, não podendo ser outro o sentido da previsão, quer da alínea a) do n.º 2 do artigo 58.º do RGCO, quer ainda da alínea a) do respetivo n.º 3, resultando da concatenação de ambas que o efeito associado à impugnação judicial da decisão administrativa é, por força do próprio RGCO, em regra suspensivo.
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