TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018
717 acórdão n.º 374/18 justamente à dimensão sancionatória que ainda se encontra pendente de julgamento; o respeito do sistema normativo pelo princípio da acusatório na vertente sancionatória, garantindo que o Tribunal Constitucional não mais seja a entidade competente para a fase de avaliação da prestação de contas e para o julgamento das eventuais irregularidades e ilegalidades detetadas, foi o vetor principal a nortear a medida legislativa, visando a norma transitória a aplicação desse novo regime aos processos penden- tes, tanto na Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, como no Tribunal Constitucional. IX – Sendo essa a ratio legis , fica claro que a reforma da fiscalização das contas anuais dos Partidos Políti- cos (e das campanhas eleitorais) operada em 2018 incide fundamentalmente no procedimento con- traordenacional e obedece ao propósito de erradicar as dúvidas aludidas por meio da substituição do modelo de dupla pronúncia do Tribunal Constitucional por outro, que reconduza o bloco normativo que enquadra o sistema de fiscalização das contas partidárias (e das campanhas eleitorais) ao modelo do regime contraordenacional geral; estando o impulso legislativo tão fortemente arrimado à identi- ficação de dúvidas de inconstitucionalidade, mal se compreenderia a introdução de norma transitória que comportasse o efeito de manter a aplicação da Lei Velha aos processos pendentes em que não se consumara o julgamento de mérito da promoção deduzida do Ministério Público; uma tal aporia não pode ser aceite, por claramente contrária à vontade do legislador parlamentar, sendo de concluir que é aplicável (imediatamente) aos presentes autos o regime jurídico decorrente da Lei Orgânica n.º 1/2018. X – No novo regime, cuja matriz se reconduz ao enquadramento do regime contraordenacional consagra- do no Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social (RGCO), incumbe à Entidade das Contas e Financiamentos Políticos a competência para proferir as decisões integradas na fase administrativa, apenas podendo ocorrer a intervenção do Tribunal Constitucional a jusante, uma vez encerrada a fase administrativa – salvaguardados os casos de impugnação de medidas que afetem direitos e interesses legalmente protegidos –, e em sede de impugnação judicial da decisão final condenatória daquela enti- dade, o que significa que o sistema normativo que passou a regular o presente processo, na dimensão sancionatória ainda pendente de decisão final, comporta, como ato necessário e prévio à intervenção jurisdicional deste Tribunal, a prolação de decisão administrativa que avalie interlocutoriamente as contas prestadas e, caso apurada a presença de irregularidades, ouvidos os arguidos, se pronuncie sobre a respetiva responsabilidade contraordenacional. XI – A receção desta competência pela Entidade comporta, por seu turno, a consequência de que, quer o juízo do Tribunal que declarou prestadas as contas com irregularidades, quer, a jusante, a promoção do Ministério Público que, a partir dessa discriminação, impulsionou a aplicação de coima, ainda que formalmente válidos à face dos comandos normativos vigentes à data em qual foram proferidos, dei- xaram de assumir, no processo de fiscalização de contas reformado, a eficácia a que estavam preorde- nadas; com efeito, importa distinguir entre a validade dos atos praticados segundo a Lei Velha – salva- guardada pelo segmento final da norma transitória contida no artigo 7.º da Lei Orgânica n.º 1/2018 –, e o seu relevo ou eficácia na disciplina processual a que se submete a Lei Nova, condição para a respetiva utilidade. XII – A descontinuidade na ordem jurídica operada pelo regime introduzido pela Lei Orgânica n.º 1/2018, assenta justamente na avaliação da necessidade, por razões fundadas na Constituição, de erradicar a pro- núncia inicial do Tribunal Constitucional e a sua projeção de efeitos; votado o novo regime a assegurar que o Tribunal Constitucional não mais proceda à verificação e discriminação de factos que depois irá
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