TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 102.º volume \ 2018

76 examinou os próprios critérios de restrição invocados pela instância nacional no caso concreto, não se satis- fazendo com mera invocação dos dados normativos aplicáveis (§ 48): o argumento da reciprocidade – já que a requerente era uma sociedade comercial peruana – e o teste da não contrariedade da iniciativa processual (uma ação de indemnização) aos “interesses gerais” previsto no § 116, frase 1, n.º 2, da Zivilprozessordnung, assente na consideração de que uma pessoa coletiva só deve subsistir enquanto for capaz de prosseguir os seus fins com as suas próprias forças e pelos seus meios. Para o juízo de não desconformidade com a Convenção da posição assumida pelos tribunais alemães, revelaram-se decisivas, além da questão da reciprocidade (§ 49), as seguintes considerações (vide ibidem ): «51. Para determinar se a restrição do direito de acesso a um tribunal pode ser considerada proporcional aos objetivos prosseguidos, considera o Tribunal necessário atribuir um peso específico às garantias processuais pre- vistas na legislação interna. O Tribunal verifica que a ordem jurídica alemã prevê no artigo 14.º, § 3 (a) da Lei de Custas Judiciais [ Gerichtskostengesetz ] a possibilidade de pedir a dispensa da obrigação de antecipar o pagamento das custas judiciais, desde que o caso tenha alguma perspetiva de êxito e não se afigure abusivo ( wanton ), e, bem assim, desde que se mostre de forma substanciada que o pagamento imediato do valor de tais custas causaria dificuldades à empresa requerente. O Tribunal salienta que tal pedido pode ser apresentado tanto por pessoas físicas como por pessoas morais, não se distinguindo entre entidades nacionais e estrangeiras. Afigura-se, pois, que a requerente teria estado em posição de apresentar um pedido desses, mas não o fez . O Tribunal verifica ainda que parece resultar do teor literal do artigo 14 § 3 (a), que esta disposição, ao contrário da possibilidade de recorrer ao abrigo do artigo 67 da referida Lei de Custas Judiciais, o qual foi considerado na decisão deste Tribunal sobre a admissibilidade do presente caso, não concede qualquer poder discricionário ao tribunal de julgamento, caso o processo a intentar não careça de perspetivas de êxito nem se afigure abusivo e desde que se tenha substanciado de forma credível que o pagamento imediato das custas causaria dificuldades à empresa requerente. 52. OTribunal reconhece que a eventual dispensa de pagar antecipadamente as custas não libertaria a queixosa da necessidade de satisfazer os adiantamentos solicitados pelo seu próprio advogado. Além disso, subsiste a possibi- lidade de o réu exigir à queixosa uma garantia respeitante ao pagamento das custas do processo ao abrigo do § 110 do Código de Processo Civil. Contudo, o Tribunal verifica que o pagamento adiantado dos honorários de advogado não é obrigatório segundo o direito alemão. O Tribunal verifica ainda que não foi provado pela empresa requerente que lhe tenha sido exigida uma garantia no presente caso » (itálicos aditados). Atendendo a todas estas circunstâncias, a conclusão retirada no processo em análise foi a de que, «na ausência de um consenso entre os Estados Parte na Convenção quanto à atribuição de apoio judiciário a pessoas jurídicas, o Tribunal considera que as restrições impostas ao direito de acesso ao tribunal da empresa requerente foram proporcionais aos fins prosseguidos[, pelo que] não foi violado o direito de acesso a um tribu- nal da empresa requerente previsto no artigo 6.º, § 1, da Convenção» (vide ibidem , o § 53; itálicos aditados). A análise desta jurisprudência torna claro que, na interpretação do TEDH, o direito a um processo equitativo consignado no artigo 6.º da CEDH pode exigir, em determinadas situações, a concessão de apoio judiciário não só a pessoas singulares, mas, ainda que em circunstâncias mais exigentes, também a pessoas coletivas, incluindo aquelas que prosseguem fins lucrativos. Tudo depende das normas processuais aplicáveis e das circunstâncias particulares dos interessados, incluindo a importância da causa para os mesmos. Ou seja, a recusa de apoio judiciário não pode ser feita de plano, em abstrato, mas exige em todos os casos e relativamente a todo o tipo de sujeitos processuais uma apreciação sobre se o direito de acesso a um tribunal do interessado está, ou não, em causa. Ora, este entendimento não é compatível com uma concretização legislativa do direito fundamental à proteção jurídica para efeitos de garantia do acesso aos tribunais que pura e simplesmente recuse tal proteção a toda uma categoria de sujeitos apenas com base na sua natureza jurídica, inviabilizando qualquer apreciação das circunstâncias em que o sujeito carenciado se encontra e do processo concretamente em causa, como sucede com a norma do artigo 7.º, n.º 3, da LADT.

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