TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

118 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL originando um débito de custas muito superior aos custos da prestação do serviço de administração da justiça (incluindo o montante da comparticipação nos custos globais do sistema de justiça), dada, também, a circuns- tância de se estar ainda no âmbito de um processo cautelar, de índole provisória, decidido com base numa apreciação perfunctória e sumária da necessidade da providência. Em tal procedimento cautelar, não se vê, aliás, como poderia a invocação de uma hipotética utilidade da prestação do serviço que fosse proporcionada aos prejuízos sofridos – e ao valor da causa – prevalecer sobre o interesse das ora recorridas em acautelar esse ressarcimento, em termos de legitimar um montante de custas de € 584.403,82, que, não só tomando como paradigma “a capacidade contributiva do cidadão médio” (Acórdão n.º 248/94, Diário da República , II Série, de 26 de julho de 1994) como mesmo considerando a dimensão eco- nómica das requerentes, constitui uma barreira significativa ao acesso aos tribunais. Não se trata, pois, apenas da relevância de um “juízo empírico” (a que se refere o Ministério Público) sobre o montante excessivo das custas, mas, antes, de considerar os efeitos que um (previsível) débito de tal montante, pela fixação das custas em função do valor da causa e sem qualquer limite máximo, realmente produz sobre o direito de acesso aos tribunais, sem que se permita ao tribunal que limite o montante de taxa de justiça devido no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a natureza e complexidade do processo e o carácter manifestamente despro- porcionado do montante em questão. O que conduz à conclusão de que está, aqui, ultrapassado já o limiar do mero “mau direito”, para se verificar uma verdadeira restrição, para além da “justa medida”, daquele direito fundamental constitucionalmente consagrado. 11. Pelo que há que concluir que o valor em causa se revela manifestamente excessivo e desproporcionado, e que a norma que prevê a fixação da taxa de justiça devida em procedimentos cautelares, e recursos neles inter- postos, cujo valor excede 49 879,79 € , em proporção ao valor da acção sem qualquer limite máximo ao mon- tante das custas, é inconstitucional, por violação do direito de acesso aos tribunais, conjugado com o princípio da proporcionalidade, mas apenas na medida em que tal norma não permite ao tribunal que limite o montante de taxa de justiça devido no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a natureza e complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcionado do montante em questão. (…)” Idêntico juízo de inconstitucionalidade, a respeito das mesmas normas, foi formulado no Acórdão n.º 116/08 e, posteriormente, no Acórdão n.º 179/14, a propósito de questão semelhante, mas respeitante às normas dos artigos 14.º, n.º 1, alínea n) , e 18.º, n.º 2, por referência à tabela do anexo I, do Código das Custas Judiciais (na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro), em que o Tribunal reiterou o entendimento firmado nos Acórdãos n. os 227/07 e 116/08. Foi ainda com base na violação destes parâmetros que o Tribunal Constitucional formulou diversos outros juízos de inconstitucionalidade a respeito de critérios de cálculo de taxas de justiça, designadamente nos já citados Acórdãos n. os 471/07, 226/10 e 421/13. Neste último, no seguimento da jurisprudência anterior, o Tribunal deci- diu julgar inconstitucionais, por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20.º da Consti- tuição, conjugado com o princípio da proporcionalidade, decorrente dos artigos 2.º e 18.º, n.º 2, segunda parte, da Constituição, as normas contidas nos artigos 6.º e 11.º, conjugadas com a tabela I-A anexa, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de abril, quando interpre- tadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da ação sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o caráter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título. Escreveu-se o seguinte, nesse aresto: “O Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de abril, com o propósito expresso de permitir “uma maior facilidade de acesso à justiça, por parte dos seus utentes”, recuperou o sistema bipartido do pagamento da taxa de justiça antes consagrada pelo CCJ96, permitindo, de novo, o seu pagamento em duas prestações (taxa de justiça inicial

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