TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
157 acórdão n.º 446/18 «(…) 4 – O IGFSS, I. P., inicia o pagamento das prestações, por conta do Fundo, no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal, não havendo lugar ao pagamento de prestações vencidas. 5 – A prestação de alimentos é devida a partir do 1.º dia do mês seguinte ao da decisão do tribunal». A recorrente pede que se julgue inconstitucional a norma que determina que o pagamento das presta- ções, por conta do FGADM, se inicia no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal e é devido a partir do 1.º dia do mês seguinte ao dessa decisão, não sendo exigível o pagamento de prestações vencidas, resultante da interpretação dos n. os 4 e 5 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de maio, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 64/2012, de 20 de dezembro. B) Enquadramento normativo e jurisprudencial i) Enquadramento normativo 7. Numa sociedade assente no princípio da solidariedade familiar, o dever de prover ao sustento das crianças incumbe numa primeira linha aos pais (artigo 36.º, n.º 5, da Constituição), dentro das suas capa- cidades económicas, até que estas estejam em condições, ou tenham dever de procurar por si, meios de sub- sistência, fundando-se esta obrigação de alimentos no vínculo que emerge da filiação. Trata-se de um dever fundamental, constitucionalmente autonomizado, que tem por beneficiários imediatos os filhos. Como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 306/05, ponto 6, «a insatisfação do direito a alimentos atinge diretamente as condições de vida do alimentando e, ao menos no caso das crian- ças, comporta o risco de pôr em causa, sem que o titular possa autonomamente procurar remédio, se não o próprio direito à vida, pelo menos o direito a uma vida digna». Por essa razão, também como se lê no referido aresto, no mesmo ponto, «do lado do progenitor inadimplente não está somente em causa satisfazer uma dívida, mas cumprir um dever que surge constitucionalmente autonomizado como dever fundamental e de cujo feixe de relações a prestação de alimentos é o elemento primordial. É o que diretamente resulta de no n.º 5 do artigo 36.º da Constituição se dispor que os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos». Referem, a este propósito, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira que «o direito e o dever dos pais de educação e manutenção dos filhos (n.º 5) são um verdadeiro direito-dever subjetivo e não uma simples garantia institucional ou uma simples norma programática, integrando o chamado poder paternal (que é uma constelação de direitos e deveres, dos pais e dos filhos, e não um simples direito subjetivo dos pais perante o Estado e os filhos)» (cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. I, 4.ª edição, p. 565). Assim, tal prestação é integrante de um dever privilegiado que, embora possa ser deduzido de outros lugares da Constituição [ v. g. do reconhecimento da família como elemento fundamental da sociedade (artigo 67.º) e da proteção da infância contra todas as formas de abandono (artigo 69.º)], está aqui expres- samente consagrado, como correlativo do direito fundamental dos filhos à manutenção por parte dos pais. Estamos, como diz Vieira de Andrade ( Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976 , 3.ª edição, p. 169), perante um caso nítido de deveres reversos dos direitos correspondentes, de direitos-deveres ou poderes-deveres com dupla natureza, em que se elevou um dever elementar de ordem social e jurídico a dever-direito fundamental. A elevação deste dever elementar de ordem social e jurídico a dever fundamental no plano constitucio- nal encontra-se também noutros textos constitucionais de países da mesma família civilizacional, designada- mente, no artigo 39.º, n.º 3, da Constituição Espanhola («os pais devem prestar assistência de toda a ordem aos filhos nascidos dentro ou fora do matrimónio, durante a sua menoridade e nos demais casos previstos na lei»), no artigo 30.º, I, da Constituição Italiana («os pais têm o direito e o dever de manter, instruir e educar os filhos, mesmo nascidos fora do casamento») e no artigo 6.º, II, da Lei Fundamental da Alemanha
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