TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

176 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL No caso, é diferente a situação da maternidade daquela da paternidade, desde logo e, sobretudo, por- que é o corpo da Mulher que está em causa, não fazendo sentido (salvo o devido respeito por melhor opinião), na sociedade moderna e igualitária em que vivemos, obrigar uma mulher a ter um filho que não deseja ou obrigar uma mulher a fazer uma interrupção voluntária de gravidez, relativamente, a um filho que deseja.” E, mais adiante, refere também o digno magistrado do Ministério Público (cfr. supra n. os 11 e 19 das presentes contra-alegações): “VI – Menciona o recorrente que existe uma discriminação entre o Homem e a Mulher, “em razão do sexo, atentos os artigos 1865.º, n.º 5 e 1869.º e seguintes do Código Civil, na interpretação de que é possível proceder ao reconhecimento judicial da paternidade contra a vontade do pretenso progenitor.” A este respeito, dir-se-á que, de facto, o que está em causa é o interesse do menor, não existindo qual- quer discriminação entre a Mulher e o Homem, desde logo porque o contrário também é possível, isto é, também é possível “proceder ao reconhecimento judicial da maternidade contra a vontade da pretensa progenitora. De facto, o Código Civil prevê também nos seus artigos 1808.º e segs., a existência de averiguações ofi- ciosas de maternidade com um regime em tudo semelhante ao da averiguação oficiosa da paternidade, existindo, aliás uma remissão de um regime para outro: cfr. art. 1868 do Código Civil.” 32.º Como consta, também, do Acórdão recorrido, de 25 de maio de 2017, do Tribunal da Relação de Lisboa (cfr. supra n.º 13 e 20 das presentes contra-alegações): “Constitui, pois, a ação de investigação de paternidade prevista nos citados normativos o único meio des- tinado à efetivação do direito fundamental ao estabelecimento do vínculo jurídico da paternidade biológica. Como já antes se teve o ensejo de aflorar, o apelante parece olvidar que as ações de investigação de pater- nidade radicam no direito fundamental à identidade pessoal, direito esse pessoalíssimo, indisponível e ina- lienável que, embora não absoluto, se encontra ao serviço do núcleo essencial da pessoa humana, como tem sido reiteradamente defendido na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça – cfr. a título meramente exemplificativo, Acs. de 09-04-2013 (P.º187/09.7DPFR.P1.S1), de 03.11.2015 (P.º 253/11.9TBVZL.L1.S1), 09.03.2017 (P.º 759/14.8TBSTB.E1.S1), todos acessíveis no citado sítio da Internet .  (…) Com efeito, a jurisprudência constitucional tem reiteradamente referido que o direito ao conhecimento da paternidade biológica e o direito à constituição e/ou destruição do respetivo vínculo jurídico cabem no âmbito de proteção, quer do direito fundamental à identidade pessoal, consagrado no artigo 26.º, n.º 1 da CRP, quer no direito fundamental de constituir família, plasmado no artigo 36.º, n.º 1 da CRP. (…) Porém, ainda que o apelante pretendesse defender o direito à sua identidade pessoal, como sendo suscetível de poder abranger o seu eventual direito a renunciar à parentalidade (o que é altamente discutível), tal dimen- são individualista teria de ser postergada, pela prevalência que resulta da CRP da tutela do direito do filho de conhecer a sua identidade biológica, a sua ascendência e proveniência familiar, atenta a concordância prática entre esses dois direitos – direito à identidade pessoal em confronto com o direito à identidade pessoal do filho. (…) Não se vislumbra, portanto, que o direito à identidade pessoal ou à autodeterminação do réu possam ou devam prevalecer sobre esses mesmos direitos, analisados na perspetiva do filho e do seu direito a conhecer a sua filiação biológica, direito este que será sempre sobreponível, posto que a natureza não absoluta deste direito não

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