TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
205 acórdão n.º 470/18 21.ª – Tal faculdade é concedida ao visado sempre que a «execução da decisão lhe cause prejuízo considerável». Já aquando da execução de decisões que apliquem medidas de caráter estrutural – nela indo implícita a verificação de prejuízo considerável – o recurso interposto tem efeito suspensivo, nos termos excecionados na segunda parte do n.º 4 do mesmo artigo. 22.ª – Inexiste impedimento, mas balizada restrição, ao exercício do direito de impugnação por parte do visado: pretendendo este, com a impugnação, a destruição da imediata executoriedade do ato – vingando entre nós um sistema de administração executiva, com o reconhecimento da primazia do interesse público sobre o interesse privado –, fica condicionado à verificação de determinado requisito (causar-lhe a execução da decisão prejuízo considerável) e ao cumprimento de um ónus (prestação de caução). 23.ª – A observada conformação do regime da impugnação radica no propósito expresso de «aumentar a equi- dade, a celeridade e a eficiência dos procedimentos de recurso judicial de decisões da Autoridade da Concorrência», com separação clara das regras processuais penais e «harmonizada com o enquadramento legal da concorrência da UE». (conclusão 6.ª). 24.ª – Objetiva a incumbência prioritária do Estado de «Assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de organização monopo- listas e a reprimir os abusos de posição dominante e outras práticas lesivas do interesse geral» e, no âmbito da sua política comercial, de garantir «A concorrência salutar dos agentes mercantis» [Constituição, arts. 81.º, alínea f ) e 99.º, alínea a) ]. 25.ª – À Autoridade de Concorrência, entidade administrativa independente (arts. 267.º, n.º 3 da Constitui- ção e 1.º, n.º 1 dos Estatutos anexos ao DL 125/2014, de 18 de agosto), cabe, precisamente, «assegurar a aplicação das regras de promoção e defesa da concorrência nos setores privado, público, cooperativo e social, no respeito pelo princípio da economia de mercado e de livre concorrência, tendo em vista o funcionamento eficiente dos merca- dos, a afetação ótima dos recursos e os interesses dos consumidores» (art. 1.º, n.º 3 dos Estatutos). 26.ª – Os poderes sancionatórios da Autoridade de Concorrência devem ser exercidos «sempre que as razões de interesse público na perseguição e punição de violações de normas de defesa da concorrência determinem a aber- tura de processo de contraordenação no caso concreto, tendo em conta, em particular, as prioridades da política de concorrência e os elementos de facto e de direito que lhe sejam apresentados, bem como a gravidade da eventual infração, a probabilidade de poder provar a sua existência e a extensão das diligências de investigação necessárias para desempenhar, nas melhores condições, a missão de vigilância do respeito pelos artigos 9.º, 11.º e 12.º da presente lei e pelos artigos 101.º e 102.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia» (art. 7.º, n.º 2 da Lei 19/2012, de 8 de Maio; cfr., igualmente, art. 6.º, n.º 2 dos Estatutos). 27.ª – Presente a margem de liberdade de conformação por parte do legislador ordinário em matéria de impug- nação de atos administrativos, o descrito balanceamento em causa entre os valores da tutela da posição jurídica do visado e o valor da realização de determinada incumbência prioritária do Estado, constitucionalmente exigida e prosseguida por entidade administrativa independente, não sendo impediente, não se mostra desrazoavelmente obstaculizador ao mais amplo exercício do direito de impugnação. 28.ª – Deverá, igualmente quanto ao regime estabelecido nos n. os 4 e 5 do art. 84.º da Lei 19/2012, considerar- -se que, «enquanto medida necessária e adequada a garantir a tutela de bens jurídicos com dignidade constitucional (…), bem como a celeridade e eficiência da reação sancionatória no caso de lesão desses bens jurídicos tutelados, não poderá ser entendido como uma restrição desproporcional ao direito de impugnação judicial da decisão admi- nistrativa sancionatória, à luz dos critérios previstos no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição» (Ac. TC 373/15). 29.ª – Não constitui objeto do presente recurso confrontar abstratamente, em termos de constitucionalidade, com referência a diversas situações hipotéticas, as normas contidas nos n. os 4 e 5 do art. 84.º da Lei 19/2012, não as limitando, na sua aplicação, ao caso concreto discutido no processo [Constituição, art. 280.º, n. os 1, alínea a) e 6; LOFPTC, arts. 70.º, n.º 1, alínea a) , 71.º, n.º 1 e 79.º-C]. 30.ª – A norma constante do n.º 5 do art. 84.º da Lei 19/2012, na sua aplicação limitada ao caso dos autos, não abrange a questão da (in)exigibilidade de prestação de caução, em vista da insuficiência de meios do visado.
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