TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

207 acórdão n.º 470/18 7.º – Sendo que essa aferição parece esquecer que o regime regra dos recursos de decisões contraordenacionais, que resulta dos artigos 59.º e seguintes do Regime Geral das Contraordenações é o de atribuição de efeito suspen- sivo da decisão ao recurso judicial de decisões contraordenacionais condenatórias. 8.º – Regime regra que consagra e assume na sua plenitude os princípios constitucionais da tutela jurisdicional efetiva em articulação com os princípios da proporcionalidade e o princípio da presunção de inocência (artigos 20.º, 18.º, n.º 2 e 32.º, n. os 2 e 10 da CRP). 9.º – A (in)constitucionalidade da norma do artigo 228.º-A do RGICSF deve, consequentemente, ser aferida por contraposição ao regime regra dos recursos em sede contraordenacional, relativamente ao qual constitui um desvio e uma exceção, exigindo do interprete constitucional a posição de dúvida sobre se as limitações/condições impostas no referido artigo 228.º-A do RGICSF são indispensáveis, por serem restritivas de direitos constitucio- nais, e são adequadas, no sentido de que outras soluções menos gravosas pudessem ser selecionadas pelo legislador ordinário em detrimento da solução adotada (proporcionalidade da restrição). 10.º – Ao invés do sustentado pelo Ministério Público nas suas alegações a posição que o intérprete deve assumir não é a de aferir a (in)constitucionalidade do artigo 228.º-A por comparação com normas inseridas nou- tros regimes contraordenacionais específicos, nomeadamente no da concorrência, pois as razões que presidiram à introdução da norma deste último regime foram razões determinadas por circunstâncias específicas de uma época que o Estado Português viveu e da necessidade conjuntural de normalizar e até acelerar a concorrência nos diversos setores de atividade económica. 11.º – Compreende-se que a restrição imposta aos efeitos dos recursos no regime da concorrência pudesse ter sido perspetivada à época em que foi introduzida como uma restrição de direitos constitucionais indispensável e logo constitucionalmente permitida, dado tratar-se, por um lado de um regime transversal aplicável a todos os seto- res de atividade e aplicável a uma realidade económica em constante mutação, em que as decisões dos reguladores só podem ser eficazes nos mercados se forem imediatamente aplicadas. 12.º – As decisões em matéria contraordenacional da concorrência são decisões que afetam não só as empresas afetadas pela decisão, mas também os demais operadores e concorrentes no mercado dessas mesmas empresas, pelo que a sua eficácia depende muitas vezes da sua aplicação imediata. 13.º – Como exemplo, pode referir-se que a aplicação imediata de uma decisão contraordenacional sancio- natória a uma empresa que atue em abuso de posição dominante pode permitir uma alteração do mercado e a sobrevivência dos seus concorrentes, que provavelmente já não conseguiriam sobreviver caso a aplicação dessa sanção não fosse imediata e não motivasse consequentemente uma alteração de comportamento da empresa que atue em abuso. 14.º – A ratio que pode conduzir nalgumas decisões jurisdicionais a aceitar como admissível a restrição por via da lei ordinária ao regime dos recursos de decisões condenatórias contraordenacionais em matéria de concorrên- cia por se considerar essa restrição indispensável à eficácia das decisões e à prevenção dos denominados recursos abusivos ou sem fundamento, não tem necessariamente aplicação noutros regimes contraordenacionais, em que a natureza das infrações e o seu sancionamento imediato não carece indispensavelmente para ser eficaz da sua aplicação imediata. 15.º – O caso dos autos de contraordenação que deram origem ao presente recurso, por exemplo e, em geral, as infrações contraordenacionais previstas no RGICSF são casos em que, pelo efeito específico e individual do efeito da sanção no infrator, o diferimento da aplicação da sanção em nada afeta a sua eficácia. 16.º – Neste enquadramento, as condições/restrições descritas no artigo 5.º supra , impostas pelo artigo 228.º-A ao regime de recursos das contraordenações do RGICSF são restrições não indispensáveis e consequentemente inaceitáveis do ponto de vista da limitação dos direitos e princípios constitucionais já referidos. 17.º – O regime previsto no artigo 228.º-A do RGICSF para os efeitos dos recursos em matéria contraorde- nacional bancária encontra-se ao nível do regime previsto em matéria civil no artigo 733.º do Código do Processo Civil para os efeitos dos embargos de executado, que também só produzem efeitos suspensivos da execução no caso do executado prestar caução.

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