TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
210 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Artigo 228.º-A Efeito do recurso O recurso de impugnação de decisões proferidas pelo Banco de Portugal só tem efeito suspensivo se o recor- rente prestar garantia, no prazo de 20 dias, no valor de metade da coima aplicada, salvo se demonstrar, em igual prazo, que não a pode prestar, no todo ou em parte, por insuficiência de meios. 6. A decisão recorrida recusou aplicar a norma extraída deste preceito, na interpretação a contrario que impõe o efeito devolutivo à impugnação judicial das decisões proferidas pelo Banco de Portugal em processo de contraordenação bancária, com fundamento na desconformidade com o (i) direito de acesso e tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º da CRP, em conjugação com o princípio da proporcionali- dade implicado no artigo 18.º, n.º 2, da CRP; e com o (ii) princípio da presunção de inocência em processo contraordenacional decorrente do artigo 32.º, n. os 2 e 10, da CRP. Invocando a jurisprudência do Tribunal Constitucional vertida nos Acórdãos n. os 674/16 e 675/16, a decisão recorrida entende que, no domínio sancionatório, são de rejeitar os fundamentos tradicionalmente invocados para sustentar a executoriedade imediata dos atos administrativos da Administração Pública e que, em geral, suportam o efeito-regra meramente devolutivo que é atribuído à fiscalização jurisdicional que fun- ciona como um controlo de mera juridicidade, porque há “um inevitável incremento do risco de erros e de decisões injustas”, associado à “inaplicabilidade ao direito das contraordenações do princípio da jurisdicio- nalidade enquanto reserva absoluta de jurisdição” e à “supressão e limitação dos princípio e garantias cons- titucionais previstas para o processo penal”. Ora, “existindo o referido incremento de risco, que demanda a necessidade de um meio impugnatório para um tribunal independente, com poderes de plena jurisdição e que salvaguarda o princípio da presunção de inocência, a garantia de uma tutela jurisdicional efetiva exige que esse mecanismo judicial permita ao arguido evitar os efeitos da decisão impugnada”. Por outro lado, o facto do depósito de metade da coima ser classificado como prestação de garantia não afasta a violação do direito à tutela jurisdicional efetiva e do princípio da presunção de inocência, “pois, em substância, do que se trata é de suportar, durante a fase de impugnação judicial, os efeitos parciais da sanção aplicada”. Tal ónus revela-se desproporcional ao “desiderato cautelar” visado pela norma, que é o de diminuir o risco de recursos meramente dilatório, “pois o legislador poderia ter optado por medidas de natureza cautelar, cujo risco – tal como sucede na caução económica previsto no processo-crime – tivesse de ser demonstrado caso a caso” e não através de uma “presunção inilidível”. Não existe “nenhuma evidência empírica (antes pelo contrário) que sustente tal presunção inilidível (ou seja, aplicável a todo universo de recorrentes) ou que sustente a conclusão de que, no âmbito do ilícito de mera ordenação social, a adoção de medidas cautelares, cujo risco não se presume de forma inilidível, não seria eficaz”. 7. Em causa está uma questão de constitucionalidade incidente sobre um aspeto específico e parcelar, de natureza processual, do regime de impugnação judicial das decisões proferidas pelo Banco de Portugal, no exercício dos poderes sancionatórios que a lei lhe confere. O objeto do recurso restringe-se à norma extraída do artigo 228.º-A do RGICSF, segundo a qual a impugnação interposta de decisões do Banco de Portugal que apliquem coima tem, em regra, efeito devolu- tivo, apenas lhe podendo ser atribuído efeito suspensivo quando o recorrente prestar garantia, no prazo de 20 dias, no valor de metade da coima aplicada, ou demonstrar, em igual prazo, que não a pode prestar, no todo ou em parte, por insuficiência de meios. OTribunal Constitucional, em apreciação de normas de semelhante sentido jurídico – artigo 84.º, n. os 4 e 5, do Regime Jurídico da Concorrência (Lei n.º 19/2012, de 8 de maio) e artigo 46.º, n. os 4 e 5, do Regime Sancionatório do Sector Energético (Lei n.º 9/2013, de 28 de janeiro – concluiu pela não inconstituciona- lidade material da efeito devolutivo da impugnação judicial consagrado nessas normas como regime-regra. No Acórdão n.º 123/18, que julgou a oposição entre o Acórdão n.º 397/17 e o Acórdão n.º 675/16, sobre a constitucionalidade da solução consagrada nos n. os 4 e 5 do artigo 46.º do Regime Sancionatório do
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