TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

254 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL pelo que, conclui, não se pode afirmar, como faz o acórdão recorrido, que esteve sempre acompanhada por advogado. Preliminarmente, importa referir que, em face da questão objeto de apreciação, bem como do teor das alegações de recurso apresentadas pela recorrente, entende‑se que os parâmetros constitucionais mobilizados mais relevantes são o princípio das garantias de defesa (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição), na vertente da proibição de indefesa e do direito ao recurso, e outrossim do direito a ser assistido por defensor (n.º 3 do mesmo preceito), em conjugação com o princípio do processo equitativo, consagrado no artigo 20.º, n. os 1 e 4, da Constituição (CRP). Na verdade, não se vislumbra em que medida a dimensão normativa ora em causa possa contender direta e imediatamente com o princípio do Estado de direito, nas suas diversas manifesta- ções, designadamente com o princípio da certeza e segurança jurídicas e da proteção da confiança (cfr. artigo 2.º da CRP), ou com o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º, n.º 1, da CRP, sendo certo que a recorrente também nada alega de concreto sobre a violação destes parâmetros constitucionais. 15. Conforme referem Gomes Canotilho e Vital Moreira (cfr., Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4.ª edição revista, Coimbra Editora, 2007, p. 516) a norma do artigo 32.º, n.º 1, da CRP, ao estabelecer que «[o] processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso», consagra uma fórmula que «é, sobretudo, uma expressão condensada de todas as normas restantes deste artigo, que todas elas são, em última análise, garantias de defesa. Todavia, este preceito introdutório serve também de cláusula geral englobadora de todas as garantias que, embora não explicitadas nos números seguintes, hajam de decorrer do princípio da proteção global e completa dos direitos de defesa do arguido em processo crimi- nal. Em “todas as garantias de defesa” engloba indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação.». O Tribunal Constitucional já se pronunciou diversas vezes sobre o âmbito deste preceito. Assim, e entre muitos outros, no Acórdão n.º 61/88 podemos encontrar uma síntese do conteúdo genérico do direito de defesa do arguido aí consagrado: «No artigo 32.º, n.º 1, da Constituição dispõe-se que «o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa». Esta cláusula constitucional apresenta-se com um cunho «reassuntivo» e «residual» – relativamente às concretizações que já recebe nos números seguintes desse mesmo artigo – e, na sua «abertura», acaba por revestir- -se, também ela, de um caráter acentuadamente «programático». Mas, na medida em que se apela para um núcleo essencial deste, não deixa a mesma cláusula constitucional de conter «um eminente conteúdo normativo imediato a que se pode recorrer diretamente, em caso limite, para inconstitucionalizar certos preceitos da lei ordinária» (cfr. Figueiredo Dias, A Revisão Constitucional, o Processo Penal e os Tribunais, p. 51, e o Acórdão n.º 164 da Comissão Constitucional, Apêndice ao Diário da República , de 31 de dezembro de 1979). A ideia geral que pode formular-se a este respeito – a ideia geral, em suma, por onde terão de aferir-se outras possíveis concretizações (judiciais) do princípio da defesa, para além das consignadas nos n. os 2 e seguintes do artigo 32.º – será a de que o processo criminal há de configurar-se como um due process of law , devendo considerar- -se ilegítimas, por consequência, quer eventuais normas processuais, quer procedimentos aplicativos delas, que impliquem um encurtamento inadmissível, um prejuízo insuportável e injustificável das possibilidades de defesa do arguido (assim, basicamente, cfr. Acórdão n.º 337/86, deste Tribunal, no Diário da República , 1.ª série, de 30 de dezembro de 1986)”. Neste mesmo sentido, escreveu-se no Acórdão n.º 109/99: «5.1. Este Tribunal tem sublinhado, em múltiplas ocasiões, que o processo penal de um Estado de Direito tem que ser um processo equitativo e leal ( a due process of law , a fair process, a fair trial ), no qual o Estado, quando faz valer o seu ius puniendi , atue com respeito pela pessoa do arguido ( maxime , do seu direito de defesa), de molde, designadamente, a evitarem-se condenações injustas. A absolvição de um criminoso é preferível à condenação de

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