TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
255 acórdão n.º 487/18 um inocente. Tal como se escreveu no Acórdão n.º 434/87 (publicado no Diário da República , II série, de 23 de janeiro de 1988), o processo penal, para além de assegurar ao Estado ‘a possibilidade de realizar o seu ius puniendi, tem que oferecer aos cidadãos ‘as garantias necessárias para os proteger contra abusos que possam cometer-se no exercício desse poder punitivo, designadamente contra a possibilidade de uma sentença injusta’. O processo penal, para – como hoje exige, expressis verbis , a Constituição (cfr. artigo 20.º, n.º 4) – ser um processo equitativo, tem que assegurar todas as garantias de defesa, incluindo o recurso (cfr. o artigo 32.º, n.º 1, da Lei Fundamental). (Cf. também o Acórdão n.º 207/88, publicado no Diário da República , II série, de 3 de janeiro de 1989).». Do mesmo modo, este Tribunal tem jurisprudência firmada sobre o direito de defesa em processo penal, quer na vertente do direito ao recurso, quer na vertente do direito a ser assistido por defensor, enquanto manifestações concretas da cláusula geral consagrada no referido artigo 32.º, n.º 1. A esse respeito, escreveu- -se o seguinte, no Acórdão n.º 314/07: «O direito de defesa do arguido em processo penal, constitucionalmente proclamado, é uma cláusula geral que inclui não só todas as garantias explicitadas nos diversos números do art.º 32.º, da C.R.P., mas também todas as demais que decorram da necessidade de efetiva defesa do arguido. Este preceito deve ser interpretado à luz do denominado processo penal equitativo e leal, no qual o Estado, ao fazer valer o seu jus puniendi , deve atuar com respeito pela pessoa do arguido, considerando-o um sujeito processual a quem devem ser asseguradas todas as possibilidades de contrariar a acusação, de ser julgado por um tribunal inde- pendente e do processo decorrer com lealdade de procedimentos, considerando-se ilegítimas quaisquer disposições, ou suas interpretações, que impliquem uma diminuição inadmissível das possibilidades de defesa do arguido. Uma das manifestações deste direito à defesa, atualmente (desde a Revisão de 1997) com consagração específica no texto constitucional (art.º 32.º, n.º 1, in fine ) é o direito ao recurso. De modo a garantir a possibilidade de defesa contra a prolação de decisões injustas, deve ser assegurada ao arguido a possibilidade de as impugnar para um segundo grau de jurisdição, delas recorrendo. Mas, para que esta possibilidade seja efetiva, é necessário que as normas processuais que regulamentam o direito ao recurso assegurem que o arguido recorrente tenha a possibilidade de analisar e avaliar criteriosamente os fundamentos da decisão recorrida, de forma a permitir-lhe um exercício consciente, fundado e eficaz desse seu direito. Neste domínio, entrelaça-se a aplicação de um outro direito constitucional processual penal, que é o direito do arguido a ser assistido por defensor (art.º 32.º, n.º 3, da C.R.P.). Na verdade, atentas as especiais exigências técnico-jurídicas que presidem à decisão sobre a eventual utilidade ou conveniência de interpor recurso e à elaboração da sua motivação, a assistência do arguido por defensor tecni- camente habilitado nesta fase é um elemento do núcleo essencial do seu direito de defesa que deve ser assegurado pelo legislador ordinário, o que sucede no art.º 64.º, n.º 1, d) , do C.P.P.. Ponderadas estas considerações gerais, poderá dizer-se que estes direitos constitucionais se mostrarão violados sempre que não se conceda um prazo razoável ao arguido em processo penal para impugnar decisão relevante que o afete, devendo nesse período encontrar-se ininterruptamente assistido por defensor tecnicamente habilitado.». 16. No caso dos autos, conforme referido, está em causa exclusivamente a conformidade constitucional da interpretação aplicada pelo tribunal recorrido no sentido de que o prazo para a interposição de recurso da sentença depositada na secretaria não se interrompe, nem se suspende pelo facto de a arguida ter pedido junto da Ordem dos Advogados a substituição do defensor que lhe fora nomeado no processo. Não é relevante, para efeitos da apreciação da conformidade constitucional de tal interpretação, saber se, conforme sustenta a recorrente, o tribunal a quo deveria ter-se pronunciado sobre o pedido de substituição de defensor (inclusive, notificando a arguida para aperfeiçoar o seu requerimento, informando-a de que a competência para conhecer do pedido de substituição de defensor é do tribunal e convidando-a a apresentar
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