TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
258 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Se, para assegurar um efetivo direito de defesa, é necessário que o arguido esteja assistido por um defensor na fase de recurso, já não se revela um requisito do núcleo essencial desse direito que a pessoa do defensor seja a mesma durante o decurso do prazo de recurso. A ponderação da decisão de recorrer e a elaboração da motivação do recurso, com a inerente escolha das ques- tões a suscitar, é um labor que, apesar de ter um cunho pessoal, permite a transmissão pelo primitivo defensor para o novo defensor do trabalho intelectual e material já desenvolvido. O prazo para a interposição do recurso é atribuído ao arguido e não à pessoa do seu defensor, não exigindo a necessidade de garantia de um efetivo direito ao recurso em processo penal, que se concedam tantos prazos distin tos quantos os defensores que se sucedam na assistência ao arguido. Se a mudança da pessoa do defensor, no decurso do prazo de recurso, é suscetível de causar alguma perturbação ao exercício do respetivo direito, não se pode dizer, numa visão geral e abstrata, que a manutenção, nesses casos, do prazo único previsto na lei (15 dias) para a dedução do recurso penal, põe em causa, de modo inadmissível, a possibilidade do arguido recorrer das decisões que o afetam. E se, no caso concreto, essa perturbação assumir uma dimensão tal que ponha em causa uma real possibilidade de exercício do direito ao recurso, o regime processual penal permite que o arguido invoque a figura do justo impedimento (art.º 107.º, n.º 2, do CPP), para que possa exercer de modo efetivo o seu direito ao recurso, nunca ficando a sua posição de sujeito processual desprotegida.». Entendeu o Tribunal, neste aresto, que em caso de renúncia de mandato, entre o momento da decla- ração de renúncia e a produção de efeitos da mesma (com a sua receção pelo destinatário), não se pode considerar que o arguido tenha ficado desprovido de defensor. Considerou ainda o Tribunal que, por não constarem da declaração de renúncia as razões de tal atitude, não ser «possível ponderar se, a partir da emis- são dessa declaração, a assistência ao arguido ficou enfraquecida, de modo a considerar-se que deixou de estar assegurado o seu direito a defender-se». Diferentemente, num caso em que se encontravam demonstradas e aceites pelo tribunal a quo as razões em que se tinha fundado um pedido de substituição de defensor nomeado, no Acórdão n.º 159/04, foi jul- gada inconstitucional a norma resultante da interpretação conjugada dos artigos 66.º, n.º 4, e 411.º, n.º 1, do CPP, segundo a qual o prazo para interposição do recurso, de 15 dias, se conta ininterruptamente a partir da data do depósito da decisão na secretaria, mesmo no caso de recusa de interposição do recurso por parte do defensor oficioso nomeado, cuja substituição foi requerida, o que foi deferido por o tribunal a quo consi- derar existir justa causa para essa substituição. 18. Regressando ao caso dos autos, importa salientar, em primeiro lugar, que tendo a própria arguida apresentado um requerimento em que informou ter pedido a substituição do defensor nomeado – sem referir as razões desse pedido de substituição –, requerendo a suspensão do prazo, que estava em curso, para inter- por recurso da sentença proferida, o tribunal de primeira instância limitou-se apreciar o requerido quanto à “suspensão” do prazo, indeferindo tal pretensão. Esta decisão veio a ser confirmada pelo Tribunal da Relação de Guimarães, pelos fundamentos acima referidos. Ou seja, o tribunal a quo entendeu que este pedido de substituição do defensor nomeado não tinha qualquer efeito interruptivo ou suspensivo do prazo em curso, considerando que, enquanto o defensor nomeado não fosse substituído, se mantinha para os atos subse- quentes do processo, por força do disposto no artigo 66.º, n.º 4, do CPP. Daí que o mesmo tribunal tenha considerado que, não obstante a apresentação do pedido de substituição do defensor nomeado, a arguida não ficou desprovida de defensor, uma vez que aquele que se encontrava nomeado continuava a sê-lo para todos efeitos, inclusive para a eventual interposição de recurso. Na verdade, estando em causa nos autos, conforme se referiu, por parte da arguida, um requerimento no sentido de ser suspenso o prazo de recurso, que estava em curso, em virtude de aquela ter solicitado a substituição do defensor junto da Ordem dos Advogados e não constando do requerimento em questão as razões do pedido de substituição (designadamente, que tal se devia à existência de divergências quanto à
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