TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
269 acórdão n.º 488/18 «1.º «Na ação de investigação de paternidade estamos perante interesses inalienáveis da pessoa, como seja o direito à identidade pessoal (art. 26.º da Constituição da República Portuguesa), nele se incluindo o direito a conhecer e a ver reconhecida a sua ascendência biológica (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, in Constituição Portuguesa Ano tada, Tomo I, pp. 284 e 285 e Gomes Canotilho e Vital Moreira in Constituição da República Portuguesa Anotada ) 2.º Através da ação, o autor/investigante está a defender o direito à sua verdade biológica e pretende ver esclarecida a sua posição social e jurídica, seja em relação ao agregado familiar em que se integra, seja em relação ao meio social em que se insere. 3.º Este direito a conhecer e reconhecer as origens genéticas (a “historicidade pessoal” como a ele se referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa , p. 462) é essencial para a identidade própria e é constitutivo da personalidade singular de cada individuo: “Ninguém deve ser obrigado a viver em discordância com aquilo que pessoal e identitarimente é” (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, op. cit. p. 609). 4.º A ele acresce o direito fundamental a constituir família, previsto no art. 36.º da Constituição da República Portuguesa, que impõe ao legislador a previsão de meios para o estabelecimento jurídico dos vínculos de filiação – os modos de perfilhar e a ação de investigação. 5.º Conforme dizem Jorge Miranda e Rui Medeiros: “no direito de constituir família, o artigo 36.º, n.º 1, abrange, ao lado da família conjugal, a família constituída por pais e filhos, podendo extrair-se deste preceito constitucional um direito fundamental, não apenas a procriar, mas também ao conhecimento e reconhecimento da paternidade e da maternidade” (cfr. op. cit p. 813). 6.º A natureza pessoalíssima destes direitos toma-os indisponíveis e imprescritíveis. 7.º Por outro lado, a Constituição proíbe a discriminação dos filhos nascidos fora do casamento (cfr. art. 36.º, n.º 4), não permitindo que estes sejam desfavorecidos ao verem limitadas as possibilidades de estabelecimento da sua filiação mediante prova do vínculo biológico. 8.º Assim, o estabelecimento de um prazo de caducidade de 10 anos, ou qualquer outro, que condiciona a ins- tauração da ação de investigação de paternidade, traduz uma restrição desproporcionada ao direito à identidade pessoal, ao direito à integridade moral e ao direito a constituir família e é inconstitucional. 9.º Neste sentido, entre outros, José Duarte Pinheiro, in “Inconstitucionalidade do artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil”, Cadernos de Direito Privado, n.º 15 julho/setembro 2006, pp. 32 a 52, Guilherme Oliveira, in “Caducidade das Ações de Investigação”, revista Lex Familiae , n.º 1, 2004, pp. 7 a 13 e Menezes Leitão, in “Anotação ao Acórdão do STJ de 19/04/2013”, Revista da Ordem dos Advogados, ano 73, Vol. I, janeiro/março, pp. 396 a 399).
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