TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

270 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 10.º Acresce que, tanto a ação de impugnação da maternidade como a ação de impugnação de perfilhação assentam nos mesmos direitos fundamentais e não se encontram limitadas temporalmente. 11.º Além disso, a razão do estabelecimento de um prazo de caducidade que se fundava no perecimento e “envelhe- cimento” da prova não tem, nos tempos que correm, qualquer sentido face à disponibilidade da prova por teste de ADN que garante um grau de certeza próximo dos 100%. 12.º Poder-se-á dizer que, ao considerar a fixação do prazo de caducidade inconstitucional, se está a colocar em causa a segurança do investigado e da família. 13.º Contudo, além do princípio da segurança jurídica não estar autonomamente inscrito na Constituição, deve entender-se que, conflituando o direito ao conhecimento da ascendência e verdade biológica com a “tranquilidade” do suposto pai, sempre tem de prevalecer o primeiro pois inscreve-se num direito de personalidade, socialmente tido como mais relevante. 14.º De facto, a segurança do investigado é, em grande medida, controlável pelo próprio e não deve ser acautelada à custa do sacrifício de um bem personalíssimo da parte contrária. 15.º Por último, o estabelecimento de um prazo de caducidade não deve servir para sancionar a inércia do investigante. 16.º É que “a apreciação da conveniência em determinar a identidade do progenitor, como elemento da sua iden- tidade pessoal, corresponde a uma faculdade eminentemente pessoal, em que apenas pode imperar a critério do próprio filho, e não qualquer “interpretação” externa do seu interesse ou utilidade deste na investigação da pater- nidade” (cfr. Acórdão deste V. Tribunal n.º 486/04) 17.º “A simples inércia ou passividade, durante certo período temporal, em tomar a iniciativa de investigação de paternidade não deve ser destrutiva da legitimidade para o fazer quando, no critério atual do próprio, tal corres- ponde ao seu interesse na constituição plena da sua identidade pessoal. Tanto mais que o querer exercer, apenas numa fase mais tardia da vida, um direito de investigação que anteriormente foi negligenciado não é suscetível de censura por uma valoração externa, segundo padrões de conduta normalizada, tão complexa e singularizada é a teia de determinantes da decisão e forte a carga emocional que, muitas vezes, a caracteriza. Sem esquecer, no mesmo sentido, que a afirmação desse interesse, numa fase etária mais avançada, pode ser legitimamente influenciada pela consideração (só então possível) do interesse de outros (e, eventualmente, por pressão destes), igualmente afetados pelo desconhecimento da ascendência do investigante (os seus descendentes, muito em particular) [cfr. Juiz Con- selheiro Joaquim Sousa Ribeiro, declaração de voto junta ao Ac. 401/11]. Nestes termos, e nos melhores de direito aplicáveis, deve considerar-se que a norma do art. 1817.º, n.º 1 do Código Civil, na parte que prevê um prazo de 10 anos para a propositura da ação de investigação de paternidade é inconstitucional por violação dos arts. 18.º, n. os 2 e 3, 26.º e 36.º da Constituição e, em consequência, negar-se provimento ao recurso».

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