TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
282 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL realização da tarefa de concordância prática entre bens ou interesses conflituantes. Já vimos em que é que se traduz a especificidade. Do que se trata, aqui, é de averiguar se existiam, no caso, meios alternativos para a realização do mesmo fim; se entre esses meios havia, ou não, diferenças quanto ao grau da sua onerosidade para os destinatários das medidas restritivas; e se, finalmente, se tinha ou não escolhido, de entre eles, o meio mais benigno ou menos oneroso. Para tanto, é necessário que, diferentemente do que ocorre a propósito do exame da adequação, se desça neste momento à análise das especificidades do caso concreto (realce nosso). É que importa agora averiguar o modo pelo qual, numa certa situação da vida, o legislador ‘pesou’ diferentes bens ou interesses constitucionalmente protegidos, e entre si conflituantes, de modo a restringir o direito que um deles protege em benefício de outro, também constitucional- mente tutelado». No Acórdão n.º 187/01, afirma também o Tribunal Constitucional, que, «Por outro lado, é sabido que a determinação da relação entre uma determinada medida, ou as suas alternativas, e o grau de consecução de um determinado objetivo envolve, por vezes, avaliações complexas, no próprio plano empírico (social e económico). É de tal avaliação complexa que pode, porém, depender a resposta à questão de saber se uma medida é adequada a determinada finalidade. E também a ponderação suposta pela exigibilidade ou necessi- dade pode não dispensar essa avaliação». Também o Acórdão n.º 23/06 teve em conta, na aplicação do princípio da proporcionalidade, dados científicos, sociológicos e normativos: «14. Na análise referida, não pode ignorar-se a evolução dos elementos relevantes para a questão de constitucio- nalidade, que, entre outras, tem determinado também a alteração de soluções legislativas e doutrinais. Tal alteração dos dados normativos do sistema (incluindo a nível constitucional) e dos elementos sociológicos e científico técni- cos, que como que “envolvem” a questão de constitucionalidade do prazo de investigação de paternidade previsto no artigo 1817.º do Código Civil, não deve, na verdade, ser desconhecida, mesmo por quem conclua que, ainda assim, tal norma pode não padecer de inconstitucionalidade. Com efeito, tem-se verificado uma progressiva, mas segura e significativa, alteração dos dados do problema, constitucionalmente relevantes, a favor do filho e da imprescritibilidade da acção – designadamente, com o impulso científico e social para o conhecimento das origens, os desenvolvimentos da genética, e a generalização de testes genéticos de muito elevada fiabilidade. Esta alteração não deixa incólume o equilíbrio de interesses e direitos, constitucionalmente protegidos, alcançado há décadas, e sancionado também pela jurisprudência, empurrando-o claramente em favor do direito de conhecer a paternidade. Grande parte da responsabilidade vai, aqui, para o peso dos exames científicos nas acções de paternidade e para a alteração da estrutura social e da riqueza, levando a encarar a outra luz a dita “caça às fortunas”. Mas nota-se também um movimento científico e social em direcção ao conhecimento das origens, com desenvolvimentos da genética, nos últimos vinte anos, que têm acentuado a importância dos vínculos biológicos (mesmo se, porventura, com exagero no seu determinismo). O desejo de conhecer a ascendência biológica tem sido tão acentuado, que se assiste a movimentações no sentido de afastar o segredo sobre a identidade dos progenitores biológicos, mesmo para os casos de reprodução assistida (cuja consideração está, evidentemente, fora do âmbito do presente recurso), tendo até, entre nós, sido já aprovada uma proposta de lei (a Proposta n.º 135/VII, in Diário da Assembleia da República, I série, n.º 95 de 18 de junho de 1999, pp. 3439-3440 e 3459-3460) que previa a possibilidade de as pessoas nascidas em resultado da utilização de técnicas de procriação medicamente assistida obterem, após a maioridade, informações sobre a identidade dos seus progenitores genéticos (realce nosso) (…). Não deve, igualmente, ignorar-se a valorização da verdade e da transparência, com a possibilidade de acesso a informação e dados pessoais e do seu controlo, com a promoção do valor da pessoa e da sua “auto-definição”, que inclui, inevitavelmente, o conhecimento das origens genéticas e culturais».
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