TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
296 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL É legítimo que o legislador estabeleça prazos para a propositura da respetiva ação de investigação da paterni- dade, de modo a que o interesse da segurança jurídica não possa ser posto em causa por uma atitude desinteressada do investigante, não sendo injustificado nem excessivo fazer recair sobre o titular do direito um ónus de diligência quanto à iniciativa processual para apuramento definitivo da filiação, não fazendo prolongar, através de um regime de imprescritibilidade, uma situação de incerteza indesejável. Necessário é que esse prazo, pelas suas características, não impossibilite ou dificulte excessivamente o exercício maduro e ponderado do direito ao estabelecimento da paternidade biológica» (cfr. o n.º 7 do Acórdão n.º 401/11). A técnica legislativa de estabelecer prazos de caducidade para a propositura da ação de investigação de paternidade, não obstante representar um ónus para o interessado em proceder à investigação, afigura-se, deste modo, como um meio ordenado a fins legítimos que não é inadequado nem desnecessário – dada a inexistência de outro menos lesivo para os interesses do investigante. Já no tocante à inexistência de um dese- quilíbrio entre os ganhos de interesse público (neste incluindo a proteção mínima dos interesses constitucio- nalmente relevantes de terceiros) e o sacrifício imposto ao interesse do investigante – o teste da proporcio- nalidade em sentido estrito –, tudo dependerá do prazo concreto a considerar, nomeadamente de saber se a respetiva duração permite ao investigante tomar uma decisão informada, livre e suficientemente ponderada. Nesse particular, o prazo consagrado no artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil – o único questionado no presente processo –, que corresponde a dez anos após a maioridade ou emancipação do interessado em inten- tar a ação de investigação de paternidade (sem prejuízo, naturalmente, dos prazos subjetivos previstos nos n. os 2 e 3 do mesmo preceito), garante que o mesmo interessado, com vinte e oito anos de idade, ou um pouco menos nos casos de emancipação, dispondo de elementos que em seu entender apontem no sentido de ser filho de um certo homem e escolha não avançar com tal ação, possua já, em regra, «um grau de maturidade, experiência de vida e autonomia que permita uma opção ponderada e suficientemente consolidada». Com efeito, «neste escalão etário, o indivíduo já estruturou a sua personalidade, em termos suficientemente firmes e já tem tipicamente uma experiência de vida que lhe permite situar-se autonomamente, sem dependências externas, na esfera relacional mesmo quando se trata de tomar decisões, como esta, inteiramente fora do âmbito da gestão corrente de interesses» (cfr. o Acórdão n.º 401/11, n.º 8; saliente-se que este entendimento, na parte respeitante à maturidade e experiência de vida do investigante, é expressamente corroborado no início do n.º 13 da presente decisão). 5. A perspetiva adotada pela maioria que fez vencimento foi diametralmente oposta: no quadro de uma “reponderação da questão” justificada com base em realidades sociológicas antigas e novos desenvolvimentos ao nível do direito ordinário e da jurisprudência constitucional, assumiu-se que a Constituição impõe ao legislador ordinário uma proteção absoluta do direito ao conhecimento da progenitura e, consequentemente, a inconstitucionalidade da consagração de qualquer prazo para intentar uma ação de investigação de paterni- dade. Por outras palavras, segundo tal perspetiva, a Constituição consagra a regra da imprescritibilidade das ações de investigação de paternidade, quando propostas pelo filho ou por quem o represente. Procurando justificar esta viragem jurisprudencial, a mesma maioria reanalisou os argumentos do Acór- dão n.º 401/11, «procedendo a novas ponderações valorativas» (cfr. os n. os 14 e seguintes). Contudo, a fun- damentação aduzida não é convincente no estrito plano constitucional. 6. Antes de proceder à respetiva apreciação crítica, importa esclarecer alguns aspetos. Desde logo, a perspetiva a partir da qual é efetuada a mencionada reanálise não tem em conta que o Acórdão n.º 401/11, como, de resto, toda a jurisprudência constitucional anterior, avalia a suficiência da proteção do direito ao conhecimento da progenitura tendo em conta a necessidade constitucional de que ao seu titular seja dada a oportunidade para o exercer eficazmente em toda a sua plenitude. Tal implica uma prevalência sobre os demais interesses contrapostos. Ou seja, no quadro correspondente a tal “janela de opor- tunidade”, aquele direito não pode ser limitado por nenhum outro. Daí que a questão constitucional não
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