TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
367 acórdão n.º 496/18 Com efeito, as considerações que abaixo se afloram foram totalmente omitidas do Acórdão n.º 187/18 e, por- tanto, da Decisão Sumária reclamada. Recorrendo às palavras do Venerando Conselheiro Carlos Lopes do Rego: “ sob pena de se desvirtuar a função processual da decisão sumária – ela não deverá precludir ao recorrente, em reclamação para a conferência, a possibilidade de apresentar argumentos ou razões, de natureza inovatória, que não hajam sido integralmente valorados no precedente jurisprudencial invocado como base da decisão sumária ” (…) Vejamos então, resumidamente, quais são esses argumentos e essas razões. A. Da denegação total de tutela preventiva – violação do artigo 18.º, n.º 3 > Colocação do problema 13. Na aproximação que faz ao Acórdão n.º 187/18, a Decisão Sumária desconsidera, por completo, dois factos da maior relevância. O facto de, por um lado, a patente exercida nos autos não ter sido concedida nos 30 dias literalmente previstos no artigo 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011. E, por outro, o facto de, nesse mesmo prazo, a A. não saber ainda que teria um litígio para resolver contra a ora Reclamada C., que viria a ser titular de AIMs para medicamentos genéricos potencialmente infratores dos seus direitos. E esta desconsideração afeta inevitavelmente a bondade da escolha jurisprudencial levada a cabo pelo Vene- rando Relator, quando se viu confrontado entre dois contraditórios acórdãos deste Tribunal. Vejamos então. 14. Qualquer litígio de natureza jurisdicional assenta, em geral, na configuração das seguintes realidades pro- cessuais: (i) direito exercido (desdobrado depois na causa de pedir e no pedido), (ii) partes (demandante, por um lado, e demandada, por outro); e (iii) tribunal. Esse desdobramento configura processualmente aquilo que o Tribunal Constitucional considera, em juris- prudência consolidada, como sendo o direito à ação, assegurado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”). Nas palavras do Acórdão n.º 187/18, o direito à ação traduz-se no “direito subjetivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional”. Para que esse direito subjetivo exista para a parte demandante, importa então: (i) de ter um direito que se possa exercer, (ii) saber contra quem se deve exercer o direito (ou seja, quem o está a violar ou se prospetiva que o faça) e (iii) determinar qual o tribunal que irá conhecer dessa pretensão. Vertendo esses três requisitos para a apreciação de uma solução normativa que estabeleça um prazo para o exercício desse direito à ação, ter-se-á de concluir que esse direito subjetivo só estará garantido pelo legislador se o litígio puder ser configurado pelo demandante nesse prazo (sem prejuízo da análise quanto à proporcionalidade desse mesmo prazo). Não podendo, o (potencial) direito à ação é totalmente subtraído ao seu titular. Como demonstraremos de seguida em maior detalhe, aquilo que o Tribunal Constitucional pede aos cidadãos, de acordo com o seu Acórdão n.º 187/18, é que aceitem que o seu direito à ação caduque num prazo imposto pelo legislador quando, naquele prazo, apenas se conhecem algumas daquelas três realidades. Foi precisamente isso que aconteceu nestes autos. Como desenvolveremos (ainda que brevemente), no prazo literalmente previsto no artigo 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011, a A. não detinha ainda o direito que veio (mais tarde) a exercer e não sabia que a ora Reclamada seria investida numa autorização administrativa que lhe permitiria violar esse direito. 15. Expliquemo-nos melhor e comecemos pela inexistência do direito exercido. Foi totalmente desconsiderado pela Decisão Sumária um facto que é determinante para a análise que cabe fazer.
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