TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
369 acórdão n.º 496/18 17. A situação factual concreta que aqui se traz (não existência do direito e desconhecimento de quem seria o titular proposto nos 30 dias previstos no artigo 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011) não é um mero “caso excecional”, como este Tribunal Constitucional trata todos os possíveis circunstancialismos que lhe foram dados a apreciar no Acórdão n.º 187/18. Veja-se, desde logo, como no caso presente coincidem dois desses casos alegadamente excecionais. E outros casos existem em que outros (e até mais) desses casos excecionais se reúnem num só processo. A aparente excecionalidade de todas essas circunstâncias, com a aparente solução que para todas existe, não pode fundamentar um juízo de não inconstitucionalidade quando consideramos (como temos de considerar) que todas elas existem e quando consideramos (como temos de considerar) que ocorrem casos em que elas estão todas congregadas. O juízo que veio a ser acolhido na Decisão Sumária reclamada falha, em grande parte, pela omissão de tantas e determinantes circunstâncias passíveis de afetar o cumprimento do prazo imposto pelo artigo 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011. Ou seja, falha na medida em que desconsidera quaisquer fatores perturbadores de uma límpida configuração jurídico-processual do litígio que potencialmente se desenha com a publicitação da reduzida informação listada pelo artigo 15.º-A, n.º 2 do Estatuto do Medicamento (cfr. sobre a inconstitucionalidade da solução sufragada no Acórdão n.º 187/18, na vertente da necessidade da solução, o parecer subscrito pelo professor David Duarte, que se dá por reproduzido e que se protesta juntar). Estes circunstancialismos são inultrapassáveis e absolutamente capitais para a análise em apreço. E, sobretudo, precipitam a Decisão Sumária para uma insanável inconstitucionalidade. > A inconstitucionalidade da solução oferecida 18. Pode a Conferência dizer que, ainda assim, a potencial inconstitucionalidade acima descrita estaria ultra- passada pelo facto de o Acórdão n.º 187/18 interpretar a conjugação dos artigos 2.º e 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011 como “não precludindo (...) o recurso aos tribunais judiciais” para exercer “os mecanismos judiciais comuns de tutela da propriedade industrial”, “quando e se o medicamento genérico vier a ser autorizado” (ponto 13.º da Decisão Sumária, página 24); ou seja, “não prejudica a ulterior defesa dos direitas de propriedade industrial caso tal infração venha a ocorrer, nos mesmos termos assegurados para a generalidade dos titulares de direitos de pro- priedade industrial” (ponto 15.5, página 36). Esse possível recurso aos tribunais judiciais admitido no Acórdão n.º 187/18 é para ser feito nos moldes seguin- tes: “como se viu, [o impulso previsto no artigo 3.º, n.º 1 dever ocorrer no prazo de 30 dias] não prejudica a ulterior defesa dos direitos de propriedade industrial caso tal infração venha a ocorrer, nos mesmos termos assegurados para a generalidade dos titulares de direitos de propriedade industrial” (ponto 15.5, página 36). Resulta da leitura do Acórdão n.º 187/18 (e, em particular, da leitura destes excertos) que o Tribunal Constitu- cional se afastou do Acórdão n.º 123/15 na medida em que permite o acesso aos tribunais estaduais para exercício de uma tutela reativa, ante a efetiva violação de direitos de propriedade industrial. O regime dos artigos 2.º e 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011 permitiria, pelo contrário, o exercício de uma tutela preventiva apenas naquele prazo e eventuais inconstitucionalidades que pudessem emergir seriam sempre colmata- das pelo facto de esse regime não eliminar a possibilidade de recurso aos tribunais judiciais para exercício de uma tutela reativa e para a qual não existe qualquer prazo. 19. Ainda que se admita que é assim que a conjugação dos artigos 2.º e 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011 deve ser lida, no que não se concede, o juízo que veio a ser acolhido comporta desde logo uma irremediável e total dene- gação de um direito fundamental dos titulares de direitos de propriedade industrial: o direito à tutela jurisdicional efetiva preventiva. Com efeito, decorre cristalinamente do artigo 20.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa que nele se garante “a tutela efetiva e em tempo útil contra ameaças ou violações de direitos, liberdades e garantias. A tutela é garantida não apenas quando os direitos são efetivamente violados, mas também quando exista o perigo de lesão dos mesmos direitos” (…).
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=