TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

370 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O que o Acórdão n.º 187/18 nos diz é que o prazo de 30 dias do artigo 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011 não levanta obstáculos particularmente gravosos, na medida em que o acesso à tutela estadual reativa está sempre garantido. 20. Mas a aceitação da denegação do acesso à tutela jurisdicional preventiva (por que a reativa estaria garantida) não pode ser constitucionalmente admitida. Decorre do artigo 18.º, n.º 3 da CRP que apenas são admitidas leis restritivas de direitos fundamentais e desde que essas restrições respeitem as condições descritas nesse preceito. Restrições essas que já estão sujeitas a “vários e severos requisitos” (…). Não são, em circunstância alguma, permitidas eliminações de direitos fundamentais. Nestes termos, a solução normativa propugnada colide frontalmente com o artigo 18.º, n.º 3 da Constituição. 21. Do n.º 3 desse mesmo preceito decorre uma outra limitação: a de que que as restrições efetuadas pela lei não diminuam a extensão nem o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais. Ora, como vimos, o direito à tutela jurisdicional efetiva preventiva da A. neste caso foi totalmente aniquilado pela interpretação sufragada na Decisão Sumária. À A. nada mais restaria, de acordo com a Decisão Sumária reclamada (ancorada no Acórdão n.º 187/18), do que aguardar passivamente pela efetiva violação dos seus direitos para então lançar mãos dos meios judiciais “comuns” e reagir contra tal infração. O adiantamento desta análise leva-nos a desembocar numa outra ponderação que importa fazer neste momento: o de que o núcleo essencial do direito de patente é, por força desta interpretação, limitado na sua extensão. 22. O direito que a A. pretende exercer pela via preventiva, o seu direito de propriedade intelectual, é ele pró- prio um direito fundamental protegido pela Constituição, por força da sua recondução ao direito de autor (artigo 42.º) ou à propriedade privada (artigo 62.º). A fundamentalidade do direito de propriedade intelectual como direito de propriedade (que é a configuração mais recorrente), manifesta-se depois nos direitos e liberdades que são conferidos ao seu titular como componentes (…) desse direito. A este propósito, e citando novamente Gomes Canotilho/Vital Moreira: “Revestindo o direito de propriedade, em vários dos seus componentes, uma natureza negativa ou de defesa, ele possui natureza análoga aos «direitos, liberdades e garantias», compartilhando por isso do respetivo regime específico (cfr. Art. 17.º), nomeadamente para efeito do regime de restrições” (…). O direito que o titular da patente ou do certificado complementar de proteção tem de explorar plena e exclu- sivamente a invenção (…), nos termos do artigo 101.º, n.º 1 do Código da Propriedade Industrial, confere-lhe um monopólio legal que lhe dá, por inerência, o poder de impedir que terceiros explorem a mesma invenção sem o seu consentimento. Ou seja, não obstante não se poder considerar o direito de propriedade industrial como um direito de conteúdo unicamente negativo, a verdade é que o conteúdo essencial desse direito corresponde à fruição de um exclusivo, por recurso aos diversos poderes que a lei para esse efeito lhe coloca à disposição – nas palavras de J. Oliveira Ascensão/ Luís Silva Morais, “este ius prohibendi é o conteúdo fundamental da patente, como direito exclusivo”. Importa também ter presente que o direito de patente é um direito temporário ou efémero: a patente, título de onde deriva o dito direito, tem uma vigência limitada a um período de 20 anos, findo o qual a invenção patenteada cai no domínio público, podendo ser livremente utilizada. O juízo de constitucionalidade da norma que resulta da conjugação dos artigos 2.º e 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011 (segundo a qual o titular de direito de propriedade industrial não pode demandar o titular de AIM além do prazo de trinta dias a contar da publicitação pelo INFARMED a que se refere o artigo 15.º-A do Estatuto do Medicamento), veiculado na Decisão Sumária, impede o recurso à tutela preventiva desses direitos, forçando o seu titular a vê-los ser violados para que os possa exercer. Em termos práticos, isso significa que a patente tenha necessariamente de ser infringida por um ou mais tercei- ros, em violação do exclusivo que o Estado concedeu ao seu titular.

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