TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
402 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL contornos do caso concreto e os elementos probatórios disponíveis no processo se poderá aferir da maior ou menor força dos meios de prova diretos e indiretos que se tenham produzido, nada obstando à prevalência de uns sobre os outros e mesmo à possibilidade de uma prova indireta constituir funda- mento suficiente para a demonstração judicial da verdade; indispensável é que a prova indireta atinja o limiar de certeza exigível para uma condenação em processo penal. IV - O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem já se pronunciou sobre a admissibilidade do recurso a prova indireta em processo penal, encontrando-se a formulação de juízos de inferência incrimina- tórios condicionada à verificação de determinados pressupostos, aos quais devem acrescer garantias processuais destinadas a assegurar que o juízo de inferência seja racionalmente exposto e sindicável por via de recurso; onde tais exigências se mostrem cumpridas – como é o caso do ordenamento proces- sual penal português −, a prova indireta é perfeitamente admissível à luz do artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, concluindo-se que o recurso a prova indiciária, designadamente a presunções judiciais, não contende com o princípio da presunção de inocência do arguido. V - Não se vislumbra de que modo a admissibilidade do recurso a prova indiciária e presunções judiciais, em fase de julgamento e como fundamento probatório de uma decisão condenatória, contende com a estrutura acusatória do processo penal; por um lado, os factos probandos que possam ser provados através de prova indiciária são exclusivamente os enunciados na peça acusatória previamente deduzi- da, quer se trate de acusação pública, de acusação particular ou de decisão instrutória de pronúncia; por outro lado, não se verifica qualquer diluição da distinção entre instrução, acusação e julgamento, na medida em o estalão probatório a que a condenação penal está sujeita – o mais exigente que se pode conceber − não é modificado em função do tipo de prova admissível, sendo a distinção entre prova direta e indireta, do ponto de vista epistemológico, perfeitamente inerte, pelo que se conclui que a norma objeto do presente recurso não é inconstitucional, seja por violação do princípio da presunção de inocência, seja por violação do princípio da estrutura acusatória do processo penal. Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que são recorrentes A., Ld.ª e B. e recorrido o Ministério Público, foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do acórdão daquele tribunal, de 10 de janeiro de 2018. 2. No âmbito de processo-crime, o tribunal de 1.ª instância proferiu acórdão através do qual, entre o mais, condenou os aqui recorrentes pela prática de um crime de fraude fiscal qualificada. Inconformados, interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa. Este tribunal, através do acórdão ora recorrido, negou provimento a tais recursos, confirmando integral- mente o acórdão recorrido. Com interesse para os presentes autos, pode ler-se nesse aresto:
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