TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
405 acórdão n.º 521/18 em apreço meramente relativa – pois sempre o diretor é admitido a fazer prova de que não teve conhecimento do escrito (ou de que não pôde impedir a respetiva publicação), a mesma presunção redunda em não mais do que uma simples prova de ínterim ou de primeira aparência, pelo que ainda quanto aos factos a que respeita pode operar, bem vistas as coisas, a mencionada regra in dubio pro reo : basta, para tanto, que através da prova trazida ao processo o diretor do periódico crie uma situação de incerteza (de non liquet ) acerca da questão de facto, ou seja, acerca dos factos integrados na presunção”. Ainda neste mesmo sentido se pronunciou o Acórdão n.º 246/96 (acessível em www.tribunalconstitucional.pt ) , no qual se decidiu não julgar inconstitucionais as normas do Art.º 22.º, n. os 1 e 2, do Regime Jurídico das Infrações Fiscais Aduaneiras, na sua interpretação conjugada, segundo a qual se presumem não nacionais as mercadorias que forem colocadas ou detidas em circulação no interior do território aduaneiro sem o processamento das competentes guias ou outros documentos legalmente exigíveis ou sem a aplicação de selos, marcas ou outros sinais legalmente pres- critos. E é ainda o caso do Acórdão n.º 276/04, que decidiu interpretar, nos termos do disposto no Art.º 80.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, o n.º 1 do Art.º 152.º, do Código da Estrada, no sentido de que este preceito se limita a estabelecer uma presunção ilidível de que o proprietário ou possuidor do veículo é o seu condutor, desde que não identifique outrem como tal, tendo-se considerado, remetendo para jurisprudência anterior do Tribunal, que a existência de presunções, mesmo em direito penal, não é constitucionalmente inadmissível, desde que ilidíveis. Todas estas decisões do TC revelam que concluir-se pela prova de um facto em resultado do funcionamento de uma presunção é compatível, em processo penal, com uma presunção geral de inocência e com o princípio in dubio pro reo . Segundo se depreende das alegações dos aqui recorrentes, estes sustentam que, no domínio do processo penal, na insuficiência de prova direta, o julgador estaria impedido, por força do princípio da presunção da inocência, de recorrer a presunções judiciais. Ou seja, nesses casos de inexistência de prova direta, impor-se-ia, segundo os recorrentes, por força do princípio da presunção de inocência, o surgimento da dúvida a respeito dos factos relevantes para a decisão, dúvida essa que, por força do princípio in dubio pro reo , teria de ser valorada em favor dos arguidos. Ora, na prova por utilização de presunção judicial, a qual pode sempre ser infirmada por contraprova, na passa- gem do facto conhecido para a prova do facto desconhecido, intervêm juízos de avaliação através de procedimentos lógicos e intelectuais que permitem fundadamente afirmar, segundo as regras da normalidade, que determinado facto, que não está diretamente provado é a natural consequência, ou resulta com toda a probabilidade próxima da certeza, ou para além de toda a dúvida razoável, de um facto conhecido. Quando o valor da credibilidade do id quod e a consistência da conexão causal entre o que se conhece e o que não se apurou de uma forma direta atinge um determinado grau que permite ao julgador inferir este último elemento, com o grau de probabilidade exigível em processo penal, a presunção de inocência resulta ilidida por uma presunção de significado contrário, pelo que não é possível dizer que a utilização deste meio de prova atenta contra a presunção de inocência ou contra o prin- cípio in dubio pro reo . O que sucede é que a presunção de inocência é superada por uma presunção de sinal oposto prevalecente, não havendo lugar a uma situação de dúvida que deva ser resolvida a favor do arguido. Se, no caso concreto, houve lugar à utilização de presunções sem a necessária credibilidade ou consistência é uma questão que já foi anteriormente analisada em termos negativos e que podemos agora de novo reiterar.» 3. Foi desta decisão que foi interposto o presente recurso, para apreciação da constitucionalidade da norma do artigo 125.º do Código de Processo Penal, «na interpretação de que a prova indiciária e a prova por presunções judiciais são admissíveis em direito penal e em direito processual penal, por violação do disposto nos números 2 e 5 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa». Os recorrentes produziram alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões: «A. A prova indiciária e a prova por presunções judiciais não são, nem deverão ser, de forma alguma admissíveis na condenação em direita penal e processual penal, por violação do princípio da presunção de inocência e da
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