TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
41 acórdão n.º 428/18 interrompia a atividade e/ou a carreira profissional dos que a ele se dedicavam, não era atrativo. Dificilmente um profissional de qualidade – gestor, advogado, economista, médico, engenheiro, etc. – aceitava afastar-se da sua atividade e/ou carreira profissional, para se dedicar ao serviço dos seus concidadãos, sabendo que, termi- nado este, se poderia encontrar em condições de vida depauperadas. Julgou-se necessário, para o atrair para a causa pública, acenar-lhe com uma garantia de estabilidade dos seus rendimentos, que lhe proporcionasse uma vida digna e sem sobressaltos. Não se olvide que estávamos então no ano onze de uma jovem democracia, ainda em fase de consolidação. E nada tinha de insólito ou, sequer, inesperado, conferir um tratamento especial aos titulares de cargos políticos, se se pensar que a própria Constituição continha, e ainda contém a previsão de um estatuto próprio para aqueles, remetendo para a lei a sua regulamentação, devendo esta dispor em matéria de «deveres, responsabilidades e incompatibilidades» e, também sobre «direitos, regalias e imunidades» (artigo 117.º, n.º 2). O instrumento encontrado – que não era, seguramente, o único possível para executar o impera- tivo constitucional – consistiu em criar uma prestação pecuniária mensal, de carácter vitalício, a favor de todos quantos tivessem exercido determinadas funções ou cargos políticos durante um certo período de tempo». 12.º Assim, delineado e estabilizado o sentido axiológico mais fundo da subvenção mensal vitalícia dos ex-titulares de altos cargos públicos, enquanto prestação não contributiva com fundamento único e exclusivo na função pes- soalmente exercida pelo seu benef3ciário, haverá boas e suficientes razões para afirmar que a redução de valor, imposta pelos n. os 7 e 8, do artigo 9.º da Lei n.º 52-A/2005, de 10 de outubro, implicando uma hipótese de retroatividade imprópria ou inautêntica (retrospetividade), não conseguem passar incólumes pelos parâmetros jurídico-constitucionais que asseguram a tutela do investimento de confiança daqueles cidadãos que não tiveram nenhum motivo normativo plausível para deixar de contar com a manutenção legal das características essenciais daquele benefício. 13.º De acordo com a jurisprudência do Tribunal Constitucional, vertida nos Acórdãos n. os 188/09, 3/10, 396/11, 862/13, 413/14 e 575/14 entre outros, a proteção jurídica da confiança, garantida – não só na sua vertente retros- petiva, mas também na sua vertente prospetiva, como recentemente enfatizou o Acórdão n.º 195/17 – à luz do artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, convoca o exame de quatro requisitos, os quais encontram a sua formulação canónica no acórdão n.º 128/2009. Nesta decisão enuncia-se o seguinte: «[p]ara que haja lugar à tutela jurídico-constitucional da «confiança» é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expecta- tivas» de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do «comportamento» estadual; por último, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa». 14.º Retornando à situação normativa sub judice , agora à luz do modelo dos quatros testes, é de concluir que os beneficiários das concretas subvenções mensais vitalícias afetadas pelas determinações constantes dos n. os 7 e 8 do artigo 9.º da Lei n.º 52-A/2005, de 10 de outubro, merecem a tutela jurídica albergada no âmbito de proteção do artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa. 15.º No que diz respeito ao primeiro teste, se por um lado é certo que o regime jurídico da subvenção mensal vitalícia dos ex-ocupantes de cargos políticos nunca foi imune a alterações legislativas com significado restritivo ou mesmo revogatório, por outro lado, não é menos certo que nenhuma das sucessivas modificações legais introduzidas à
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