TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

432 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Assim, no Acórdão n.º 427/07, o Tribunal Constitucional decidiu julgar inconstitucional, por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20.º da Constituição, conjugado com o princípio da propor- cionalidade, decorrente dos artigos 2.º e 18.º, n.º 2, segunda parte, da mesma Constituição, a norma que resulta dos artigos 13.º, n.º 1, e tabela anexa, 15.º, n.º 1, alínea m) , e 18.º, n.º 2, todos do Código das Custas Judiciais, na versão de 1996, na interpretação segundo a qual o montante da taxa de justiça devida em procedimentos cautelares e recursos neles interpostos, cujo valor excede 49 879,79 € , é definido em função do valor da ação sem qualquer limite máximo ao montante das custas, e na medida em que se não permite ao tribunal que limite o montante de taxa de justiça devido no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a natureza e complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcionado do montante em questão. Escreveu-se nesse Acórdão: «Sobre o problema de saber se, com a inexistência de qualquer limite máximo para a taxa de justiça devida em procedimentos cautelares e recursos neles interpostos, cujo valor excede € 49 879,79, o montante deste tributo pode vir – e concretamente vem – a tornar-se flagrantemente desproporcionado ao serviço prestado, de tal forma que se revela “completamente alheio” ao custo da prestação deste ou à utilidade que o particular dele retira, apenas se dirá que não procede o argumento, avançado pelo Ministério Público, da “normal com- plexidade e delicadeza que está subjacente à generalidade dos litígios que envolvem valores dessa natureza”, que nem sempre se verificará na direta proporção do valor da causa e sem qualquer limite máximo. E também não procede o argumento da “relevância económica dos direitos e interesses que subjazem ao ato ou procedi- mento – e, portanto, da ‘utilidade’ auferida pelo utente – cuja prática se pretende alcançar ou cuja tramitação se desencadeia”, pois não é forçoso que a utilidade que se pretende retirar do serviço de administração da justiça aumente proporcionalmente ao aumento do valor da ação. Entende-se que o aprofundamento dos limites objectivos à qualificação de um tributo como taxa ou como imposto – designadamente, a consideração de que se está perante um serviço apenas prestado pelo Estado (dado o monopólio público do uso da força) e a fixação das custas em proporção direta ao valor da causa sem qualquer limite máximo – não poderia deixar de conduzir a considerar que a “taxa de justiça” devida em proce- dimentos cautelares, e recursos neles interpostos, no montante de € 584 403,82, é desproporcionada ao custo do serviço ou à utilidade tirada do procedimento cautelar. Pelo que, nestas circunstâncias, ficaria mesmo posta em causa a relação de correspondência entre o serviço e o tributo, o qual dificilmente poderia ser qualificado como verdadeira taxa. 9. Deve, aliás, notar-se que o que está em causa na dimensão normativa em apreço não é tanto – ou não é apenas – a bondade constitucional do critério elegido para a fixação das custas em função do valor da causa, mas, tendo em conta os demais elementos do critério de tributação, ou seja, os concretos escalões quantitativos fixados e o modo como operam, a ausência de qualquer limite máximo para o valor da causa, e, consequente- mente, para os resultados da aplicação daquele critério na determinação do valor da tributação em custas, inde- pendentemente da complexidade do processo, ou, mesmo, da sua concreta e efetiva utilidade para o recorrente (podendo tratar-se, como no caso, de um procedimento cautelar). […] Na verdade, sempre poderá dizer-se que a aplicação de um tal critério conduz a que, a partir de um certo limite, não possa o montante de taxa devida encontrar justificação seja no princípio da equivalência seja no princípio da cobertura de custos Como se pode ler na declaração de voto aposta ao Acórdão n.º 349/02, entende-se que «não carece de mais justificações a verificação de que ocorre, em consequência da interpretação perfilhada pela 1.ª instância e afastada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, uma situação em que a taxa calculada é de “montante manifesta- mente excessivo”, ou seja, em que há uma “desproporção intolerável” entre “o montante do tributo e o custo do (...) serviço prestado” (…). E, justamente por ser manifestamente exorbitante o valor calculado em função da mesma norma, ocorre também uma violação evidente do direito de acesso ao direito e aos tribunais, sem que seja necessário entrar em considerações relacionadas com o instituto do apoio judiciário, aqui descabidas».

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