TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

449 acórdão n.º 565/18 lado, a lei acautela um mínimo de proteção relativamente às pessoas mais vulneráveis, prevendo que nas eventualidades de omissão de apresentação declaração de rendimentos, ausência de profissão certa ou de rendimentos declarados muito baixos, o tribunal apure o rendimento mensal do lesado com base na retribuição mínima mensal garantida à data da ocorrência, e mesmo que o lesado tenha uma profissão, mas se encontre numa situação de desemprego, deve o tribunal optar pela solução mais favorável àquele. VII - Considerando todos estes dados, em particular a circunstância de eventuais desvantagens para o interessado decorrerem de um seu comportamento censurável e de as mesmas não se traduzirem numa desproteção total e, outrossim, a importância e a certeza de ganhos de interesse público associadas à solução na norma sub iudicio , não se mostra comprovadamente desequilibrada a rela- ção entre a carga coativa inerente a tal solução e os benefícios que da mesma resultam do ponto de vista daqueles interesses, devendo prevalecer, em tais circunstâncias, a avaliação feita pelo legisla- dor democrático. VIII - Quanto ao controlo da liberdade de conformação do legislador à luz do princípio da igualdade, tendo em conta o potencial diferenciador da norma questionada e ainda a matéria sobre a qual a mesma incide – o direito fundamental à prova ínsito no direito à tutela jurisdicional efetiva –, importa veri- ficar em face do artigo 13.º da Constituição se dela efetivamente resulta um tratamento desigual para as duas categorias de sujeitos implicadas – os lesados em consequência de acidentes de automóveis (“grupo alvo”) e os demais lesados (“par comparativo”) – e, na medida em que essa diferença ocorra de facto, se a mesma não dispõe, seja quanto ao critério que lhe subjaz, seja quanto à extensão em que surge concretizada, de um fundamento material razoável. IX - Embora a opção diferenciadora relativamente aos lesados na sequência de um acidente de viação concretizada no artigo 64.º, n.º 7, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, se traduza numa restrição ao direito à tutela jurisdicional efetiva – cerceando a possibilidade de demonstrar em juízo que se tem razão quanto à alegação de um certo dano, impedindo, desse modo, que o tribunal possa chegar a uma apreciação exata da realidade fáctica – e vise prosseguir diversos objetivos com relevância constitucional, torna-se questionável a opção diferenciadora, seja quanto ao critério que lhe subjaz, seja quanto à extensão – a limitação probatória referida – em que surge concretizada; face aos fun- damentos invocados, não se vislumbra que os mesmos suportem em termos razoáveis a diferença de tratamento estatuída. X - A diminuição da litigiosidade e consequente alívio dos tribunais, por si só, não se mostra apta a justi- ficar uma tão intensa diferenciação relativamente ao direito fundamental à prova entre os dois grupos de lesados considerados. Tal desiderato, em si mesmo legítimo e prima facie legitimador de medidas diferenciadoras promotoras de uma maior eficiência, não pode ser prosseguido por via da imposição de limitações aos direitos fundamentais de pessoas que, por razões alheias à sua vontade, integram universos subjetivos de grande dimensão (os lesados em consequência de acidentes de viação) por comparação com outros universos mais pequenos integrados por pessoas em circunstâncias idêntica (os lesados em consequência de acidentes de outra natureza); assim, a discriminação negativa do lesa- do em consequência de acidente causado pela circulação de veículo terrestre a motor em causa não se mostra materialmente fundada, sendo por isso mesmo arbitrária.

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