TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

451 acórdão n.º 565/18 Isto dito verifica-se que a pesada desvantagem para o lesado em acidente de viação, acarretada pela solução de afastar outros meios de prova, não encontra justificação bastante nas finalidades pretendidas. O prejuízo sentido pelos lesados excede, de forma desmesurada, os benefícios perseguidos pela solução legal em análise. Assim sendo, no caso, a limitação probatória imposta no regime de fixação da indemnização devida por aci- dente de viação, impedindo, em absoluto, a valoração de meios de prova que poderiam demonstrar factos relevan- tes e imprescindíveis para apurar o valor indemnizatório justo a atribuir aos lesados, não se mostra equilibrada em face do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva. Tal limitação, associada à especial fragilidade da vítima de acidente de viação, pode pôr em causa, de forma intolerável, o justo reconhecimento dos danos sofridos, sendo desconforme com a justiça e equidade que devem ser apanágio do processo. A restrição probatória ínsita na interpretação normativa em análise, na medida em que constitui um obstáculo a que o julgador apure o dano efetivo do lesado, numa componente tão importante, anulando a margem de liber- dade de decisão, quanto à pertinência de valoração e utilidade de produção de outros meios de prova, comporta uma significativa afetação do direito à tutela jurisdicional efetiva, na vertente da garantia de um processo equita- tivo, conducente ao justo ressarcimento do lesado, vítima de acidente de viação. Concluímos, desta forma, pela inconstitucionalidade da interpretação normativa em apreciação, por violação do direito à tutela jurisdicional efetiva, na vertente da garantia de um processo equitativo. (…)”» (fls. 1176-1178) 2. O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Guimarães interpôs recurso de constitu- cionalidade deste acórdão, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea a) , da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (adiante referida como “LTC”), para apreciação da constitucionalidade do artigo 64.º, n.º 7, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, na redação dada pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 153/2008, de 6 de agosto, cuja aplicação foi recusada com fundamento em inconstitucionalidade. (fls. 1208-1209). 3. Admitido o recurso (fls. 1313 e 1326) e subidos os autos a este Tribunal, foi determinada a produção de alegações (fls. 1331). 3.1. O Ministério Público alegou, reiterando a posição já assumida no âmbito do processo em que foi proferido o Acórdão n.º 383/12 (disponível, assim como os demais adiante citados, em http://www.tribunal - constitucional.pt/tc/acordaos/ ), e formulou as seguintes conclusões:  «1.ª) Vem interposto recurso, pelo Ministério Público, para si obrigatório, nos termos do disposto nos artigos 70.º, n.º 1, al. a) , e 72.º n.º 1, al. a) e 3, todos da LOFPTC, “do acórdão proferido nos autos em epígrafe [proc. n.º 2222/11.OTBVCT.G1, do Tribunal da Relação de Guimarães – Apelação – 1.ª, em que é recorrente B., S.A. e recorrido C. e outros]” pois que o “referido aresto declarou inconstitucional a norma contida no art.º 64.º n.º 7 do Regime Jurídico do Seguro Obrigatório da Responsabilidade Civil Automóvel – Decreto Lei 291/2007 de 21/8 na redação que lhe foi conferida pelo Decreto Lei n.º 153/2008 de 6/8 que prevê que “Para efeitos de apu- ramento do rendimento mensal do lesado no âmbito da determinação do montante da indemnização por danos patrimoniais a atribuir ao lesado, o tribunal deve basear-se nos rendimentos líquidos auferidos à data do acidente que se encontrem fiscalmente comprovados, uma vez cumpridas as obrigações declarativas relativas àquele período, constantes de legislação fiscal”. 2.ª) “O referido aresto”, aduz ainda o requerimento, “alicerçou-se no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 383/2012 de 21/9 […] que julgou materialmente inconstitucional a interpretação normativa extraída desta norma por violação do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, na vertente de garantia de um processo equita- tivo, consagrada no art.º 20.º n.º 4 em conjugação com o art. 18.º n.º 2 ambos da Constituição e do direito à justa reparação do dano, decorrente do art.º 2.º da Lei Fundamental” (fls. 1208 e 1209). 3.ª) No aludido Acórdão n.º 383/12, proc. n.º 437/10, de 12 de julho, o Ministério Público, na sua alegação de recurso, que aqui se dá por inteiramente reproduzida, já se tinha pronunciado no sentido da inconstitucionali- dade da interpretação normativa em causa.

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